Pra lá de Iguaçu: Missões paraguaias e argentinas, por Dani S.

Jesús, Paraguai. Foto: Daniela Siqueira

Relato de 2010. Para um relato de 2015, clique aqui.

Acho que tudo começou com um comentário da Juliana Amorim, perguntando se valia a pena esticar de Foz do Iguaçu até as missões jesuítas do Paraguai e da Argentina, que estão ali perto. O assunto ficou reverberando por alguns posts, eu dei uma pesquisadinha, e chegamos à conclusão de que o bate-volta não valia a pena, mas que era uma grande continuação de viagem, seja de carro alugado, seja de ônibus.

Pois a Daniela Siqueira (ou Dani S. para os habituês) estava planejando uma viagem pré-carnavalesca e achou que este roteiro missioneiro era tudo o que ela precisava para tornar original sua peregrinação a Foz do Iguaçu. Deu certo: a viagem foi o máximo, e assim que ela voltou, postou um comentário enciclopédico de fidibeque — que, claro, só podia virar post. Sensacional, Dani! Vamos ao relato:

(Para saber onde cada foto foi tirada, passe o mouse sobre a foto, que aparece a legenda.)

Jesús, Paraguai. Foto: Daniela SiqueiraTrinidad, Paraguai. Foto: Daniela SiqueiraSan Ignacio Mini, Argentina. Foto: Daniela Siqueira

Dando retorno da minha viagem – que foi fantástica:

Pousamos em Foz e fomos direto pra Argentina, de táxi. Ficamos dois dias em Puerto Iguazú, uma cidade bem pequena, mas charmosinha.

Daí, alugamos um carro (o aluguel ficou mais barato na Argentina, fizemos reserva pela Hertz no Brasil, e o carro pode entrar no Brasil sem problemas, mas não no Paraguai) e seguimos viagem para Posadas, a capital da província argentina de Misiones.

No caminho, choveu (já disse que eu atraio chuva?) e não pudemos visitar em San Ignacio, como planejado. Só almoçamos em um restaurante próximo às ruínas, que não parecia nada promissor (chama-se Carpa Azul, ou algo assim), mas que tinha um pacu na brasa surpreendentemente bom.

Seguimos para Loreto e Sant’Ana. Parênteses explicacional: as missões jesuíticas são cerca de trinta ruínas, na Argentina, Brasil e Paraguai, remanescentes do período de 1630 até a expulsão dos jesuítas. Começaram no Brasil, na região do Guairá (onde existiam as Sete Quedas), mas foram descendo pro sul pra fugir dos bandeirantes paulistas. Oito dessas ruínas foram tombadas pela UNESCO: no Brasil, só Santo Ângelo, no RS; na Argentina, San Ignacio Mini, Sant’Ana, Nuestra Señora de Loreto e outra mais distante; e três no Paraguai, sendo que Jesús e Trinidad são as mais fáceis de visitar.

As missões reuniam os índios guaranis, sendo que sua estrutura física era composta de uma igreja, colégio ou oficinas de trabalho e cemitério, e das casas destinadas aos índios, tudo em torno de uma grande praça comum. Grande parte das antigas cidades – que chegaram a ter até 7000 habitantes, como Loreto – foi abandonada depois da expulsão dos jesuítas (outros religiosos tentaram continuar a experiência, mas não deu certo) ou destruída, principalmente pelos paraguaios, nas guerras pela posse dos territórios.

As missões na Argentina e no Paraguai têm um ingresso comum (por país), que permite a visita às outras missões em 15 ou 3 dias, respectivamente. Na Argentina, o ingresso comum custa 50 pesos, e no Paraguai, 25.000 guaranís (que dá a estonteante quantia de 5 dólares). É só comprar na primeira missão que visitar, e mostrar o ingresso nas demais.
Fecha parênteses.

Loreto e Sant’Ana são ruínas, mesmo, dentro de uma quase-floresta, mas têm guias ótimos, dispostos a passear com você mesmo com garoa. Foi bom conhecê-las primeiro, já que San Ignacio Mini já é mais reconstruída, e a ordem contrária deixaria a comparação injusta. Cuidado apenas com as placas: o que parece ser um outdoor de cada missão é mesmo a placa de entrada das estradinhas que levam às atrações. A estrada para Loreto é horrível, com asfalto cheio de buracos, mas curta.

Fomos dormir em Posadas, ainda na Argentina, que já é uma cidade grande e até que bem bonitinha, na margem do rio Paraná. Ficamos no Hotel Posadas, bem central (não achei nenhum hotel interessante por lá, acabamos escolhendo pela localização mesmo). A costanera (beira-rio) deles é super arrumadinha, com calçadão e vários restaurantes. Recomendamos o Mama Chula, especializado em massas – fica ao lado de uma enorme FarmaCity, que tem de tudo.

No dia seguinte, expedição antropológica ao Paraguai. Você pode contratar um táxi em Posadas (cobram 250 pesos para ir a Trinidad, e 300 para incluir Jesús, para duas pessoas), ou ir com alguma excursão. Preferimos ir de ônibus, pra ver como é. É só pegar o ônibus internacional, escrito Encarnación, que passa no centro de Posadas. O colectivo é muuuuito lotado, mas tem ar condicionado. Pára na aduana argentina, e todo mundo desce pra fazer a imigração, em uma filinha. Você pode pegar o próximo ônibus, com um papelzinho que te dão quando da compra do bilhete, que custa 4 pesos por pessoa. Todo mundo sai da imigração argentina e pega o ônibus, que atravessa a ponte extensa sobre o Paraná. Do lado paraguaio, outra descida, pra fazer a entrada – nos disseram que é necessário fazer a imigração, porque senão, na volta, podem te multar por não ter o tal papelito. Até entre os argentinos da fronteira, o Paraguai tem uma reputação horrível. A fila é demoradinha, mas tranqüila. Toca subir no ônibus de novo, e seguir até a rodoviária.

Chegando na rodoviária, pedimos informação, e fizemos câmbio: o câmbio é um homem com uma bolsa de couro, sentado em uma cadeira na plataforma. Ele te fala o câmbio, faz as contas em uma calculadora pra não ter erro, você dá o dinheiro e ele abre a bolsa e tira de lá as notas de guarani. Trocamos 100 pesos (mais ou menos R$ 50,00) e deu e sobrou. Aí toca procurar o ônibus que vai pra Trinidad. Uma empresa só tinha pra 40 minutos depois, e aí saímos correndo pra pegar um outro ônibus, que já estava saindo. A vantagem é que TODO MUNDO no Paraguai é super simpático, e te explica tudo. Lá fomos nós de ônibus à missão Trinidad.

Trinidad, Paraguai. Foto: Daniela Siqueira

Uns 35 minutos depois, chegamos à entrada da missão. De novo, um outdoor anuncia a entrada (é só pedir no ônibus, que eles param direitinho). Daí, se caminha uns 500 metros pra entrada do parque. Trinidad é DE LONGE, a MAIS LINDA DAS MISSÕES. A igreja ainda tem várias esculturas, algumas com as pinturas originais, e o complexo todo é enorme e bem preservado. Vale a pena toda a peregrinação de ônibus no Paraguai só pra vê-la. Linda, linda, linda.

O ônibus que leva a Jesús também está em ruínas. Foto: Daniela Siqueira

De lá, volte pra estrada, atravesse, e caminhe uns 100 metros até um posto de gasolina. Lá, ficam uns táxis e uns ônibus lotação esperando chegar gente para ir a Jesús. A passagem custa 1.000 guaranís (cerca de 1 dólar) cada perna. São uns 12 km por uma estradinha simpática até a cidadezinha de Jesús, e o ônibus te deixa na missão, e te espera por meia hora. É tempo suficiente pra essa missão, cuja igreja não chegou a ser concluída, mas que fica num lugar lindo, no alto de um morro (a vista parece coisa digna da Toscana). Voltando à gasolinera, é só esperar no ponto até outro ônibus passar, com destino a Encarnación.

Sinceramente, achamos Ciudad del Este até que bonitinha depois de Encarnación. Esta cidade está de mudança, pois vão fazer uma represa no Paraná, e a parte velha está caindo aos pedaços, e a parte nova parece um monte de conjuntos do BNH (só vimos do ônibus). Compramos uma camisa do Paraguai pra coleção do marido, e voltamos à romaria do ônibus pra Argentina.

Contabilidade final: 9 pesos argentinos + 2 dólares por pessoa, e muita história pra contar – muito mais antropológico que ir de táxi!

San Ignacio Mini, Argentina. Foto: Daniela SiqueiraJá no caminho de volta para Foz, passamos em San Ignacio Mini, que é a mais visitada das missões, e a mais restaurada. O museu (com ar condicionado, eba!) é bem explicativo, e as ruínas já estão bem restauradas. Há tótens com explicações gravadas na frente de cada construção. Trinidad é beeeem mais bonita, mas San Ignácio é mais fácil de ir, e dá uma boa idéia da magnitude das missões jesuíticas.

A estrada pra Posadas é muito boa, apesar de pista simples não tem um buraco. A região é muito bonita também, e apesar de só vermos o rio Paraná já em Posadas, cruza vários arroyos. Chamam a atenção na estrada os vários altares, com bandeiras vermelhas. Segundo me explicaram, são locais de veneração dedicados a pessoas santas, como o Gauchito Gil.

Então seguimos para Foz do Iguaçu.

Obrigado, Dani!

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64 comentários

Opa! Acabei chegar de lá de Foz!!! ( em tempo real, meu voo chegou as 19h aqui no Rio)Não fui desta vez , mas na próxima já está decidido: vou!
Riq, lembro de vc dizendo que não tinha ido a Itaipu. Eu fui e achei muito chato!!! Pra quem gosta de tecnologia, construções e coisa e tal é uma beleza. Mas eu não me enquadro nos itens anteriores e prefiro a emoção do Aventura nautica. Tudo bem , concordo que a construção é Fantastica mas não vale 1h 30 ( quase dormi no video)
Fiquei no Mercure , que não é mais Mercure. ( agora é só Hotel Internacional)
Achei os restaurantes do lado brasileiro caidinhos ,com exceção da super padaria 24h ao lado do antigo Mercure que além de ter WI FI gratuito ( no hotel era R$ 0.50 o minuto) a comidinha caseira baratinha arrebentava a boca do balão. O tal restaurante TRAPICHE indicado pelo $ RODAs é uma roubada, caimos no conto do Rodizio de frutos do mar e tivemos que comer MUITO arroz com peixe (porque não era Paella nem aqui nem n Paraguai)e pagando caro!!! Do lado argentino:
Aproveitamos o AQVA do lado argentino( obrigada pela dica RiQ) e fomos tb ao EL QUINCHO del Tío Querido para as parrillas( só atenção que ele fecha 14h30 e reabre as 19h)(https://www.eltioquerido.com/),encontramos uma loja de vinho bem bacana na Republica Argentina com preços bons.Preferi fazer os passeios para aproveitar o cambio favoravel e não me arrependi. Agora o lado argentino é bem sobe e desce, haja perna e disposição.
Usamos sempre o transporte publico ( de ambos os lados) sem problema algum. Fomos a Ciudad del este para ver qual era ( sem comentarios) e usamos para nossa segurança um taxi que nos esperou. o cara não queria nos levar nas lojas que levamos como referencias ( aquelas citadas aqui em um outro post sobre Ciudad Del Este) e para não nos aborrecermos fomos na Monalisa que era facil de encontrar.
Acho que esqueci algo mas depois eu lembro e comento.
Abração e vamos ver o desfiles das Camnpeãs do Carnaval!!!

Fiz algo parecido também quando fui. Posadas de base, indo de onibus para Encarnacion.A única coisa é que so fui em San Ignacio Mini e Trinidad – mas já valeram demais a pena.
Dureza foi a volta, que o motorista esqueceu que eu ia ficar na rodoviaria e foi embora direto, até que perguntei, e ele me largou em umas bocadas que tá doido hehehe.
mas tranquilo, peguei o próximo e voltei prá fronteira. Detalhe sobre o papelzinho: na volta prá Argentina esqueci de ‘sair’ do Paraguai, mas como ninguém me perguntou nada, foi de boa

Viagem ótima como complemento a Foz, sem dúvida

Interessante esta adoração a Gauchito Gil, como no México e outros locais da América Latina.No Memorial da América Latina há um material incrivel sobre estes santos não oficiais, muito bom para quem não conhece ainda!

Fiz esta viagem há 30 anos (tinha uns 15 aninhos e tive uma bela aula de geografia, história, sociologia, enfim …).Fomos pelo RS (Iraí, Ijuí,São Borja, São Miguel), passamos para o lado Argentino, Paraguaio, Foz do Iguaçu, Sete Quedas, navegamos no Rio Paraná (passando por Paraná, Mato Grosso e São Paulo).
Adorei ver as diferenças das obras produzidas pelos indigenas e pelos jesuitas lado a lado, técnicas de construção e imaginar como formaram um bolsão tão grande na região das missões e que por fim chegou a ser considerada uma ameaça e acabou sendo dizimada de forma tão cruel!!!Foram massacrados!!!!

O Marco tá segurando o busão pra ele não cair ?
( o busão, não o Marco)

    O engraçado é que encontramos duas brasileiras e uma argentino antes de pegar esse ônibus, e a surpresa foi unânime: “Isso anda?”
    Anda, de porta aberta, mas anda. :mrgreen:

    Eu já havia elogiado e agradecido quando você escreveu o comentário, mas não tinha imaginado o estado desse ônibus! Gente, que aventura! Ainda bem que ele anda!

    Eu conheço esse ônibus, ele fazia a linha 32 aqui em Niterói pelos idos de 1975. Depois de muito viajar na viagem, acabou no Paraguai…

Dani , é assim meio Angkor , com uma cor avermelhada ?? 😉

    O calor é igual, Sylvia! E Loreto lembra aquele templo Ta Phrohm, cheio de árvores pra todo lado (só que é bem mais destruído).

Eu só fui em San Ignacio Mini, mas agora fiquei com vontade de conhecer as outras missões. Adorei o roteiro!

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