Minha coluna desta semana na Época. Os leitores habituais do blog vão reconhecer alguns trechos de posts e comentários espalhados ao longo da semana passada. (Mas o fato de a crônica parecer uma mistura da capa da Vejona com a da Vejinha São Paulo desta semana é mera coincidência...)
Eu considero São Paulo uma cidade infinitamente melhor do que Nova York, Paris, Londres ou Roma. Por uma única, e decisiva, razão: entre essas cinco grandes cidades, São Paulo é a única que está a 45 minutos de vôo do Rio de Janeiro.
Ou melhor, estava – no tempo em que seu aeroporto central, Congonhas, não era obrigado a fechar a cada chuvinha mais prolongada. Ou quando os controladores aéreos não estavam em permanente operação-padrão. Ou quando o Cidacta não saía do ar a todo momento.
Se bem que, mesmo antes dessa (perdão) enxurrada de problemas recentes, a equação dos 45 minutos de vôo de/para o Rio de Janeiro já não era tão fácil de ser demonstrada. Decolar e, sobretudo, aterrissar no horário de pico do começo da noite vinha sendo um inferno ainda no tempo em que não se falava em caos aéreo. A verdade é que o aeroporto de Congonhas já era superutilizado mesmo quando suas duas pistas funcionavam o dia inteiro.
Como deixamos a situação chegar a esse ponto? Há 20 anos, Congonhas era um aeroporto estritamente regional. Afora a ponte aérea e os vôos para o interior, só havia o programa VDC, Vôo Direto ao Centro, que ligava Congonhas à Pampulha, a Curitiba e a Brasília. Vôos para todas as outras capitais, quando existiam, envolviam alguma escala. Quer ir para Salvador? Precisa pousar antes em Ilhéus ou Porto Seguro. Porto Alegre? Só se passar em Curitiba ou Caxias.
Essa foi a época do crescimento da TAM – que, mesmo com uma frota de Fokkers acanhados e tarifas mais altas, conquistou o viajante de negócios. Sua concorrente, a Nordeste/Rio-Sul, também mantinha um alto padrão (e tinha aviões melhores).
Então apareceu a Gol, com uma proposta inicial de tarifas supereconômicas. Nos outros países, as companhias aéreas de desconto usam aeroportos secundários ou fora de mão, onde pagam taxas menores e não se arriscam aos atrasos dos horários de movimento. Mas por aqui, o governo, para forçar a guerra de tarifas, instalou a nossa primeira "low-fare" no quartel-general das "premium", Congonhas. Foi um empurrão e tanto para a Gol – e para o crescimento do mercado. Mas ninguém se preocupou em medir corretamente as conseqüências.
Se a Gol podia voar para todo o Brasil a partir de Congonhas, as outras também queriam. De repente, Congonhas passou a ter vôos diretos para tudo quanto é lugar. Para que ir a Porto Alegre por Cumbica, se o vôo que sai de Congonhas também era sem escalas e, graças à concorrência da Gol, custava o mesmo (ou menos) do que por Guarulhos?
A guerra de tarifas levou à crise na Varig e ao acordo de compartilhamento de vôos com a TAM. O acordo cartelizou a aviação: a Gol aumentou seus preços quase ao nível das outras, e as outras baixaram seu serviço de bordo quase ao nível da Gol. Passamos um ano acompanhando a agonia de Varig e, quando nos demos conta, Congonhas tinha se tornado o maior centro de conexões de vôos do país. De aeroportozinho regional, Congonhas passou a ser o aeroporto onde o Brasil inteiro vem fazer baldeação. Mesmo quando reformarem a pista e o aeroporto voltar a funcionar na chuva, não vai dar certo.
Semana passada o caderno de viagem do semanário inglês The Observer sugeriu a seus leitores 50 viagens para ser feitas sem avião. Não, a Inglaterra não está vivendo nenhum caos aéreo. Lá os vôos começam a ser malvistos por outro motivo: as emissões de carbono.
Nem assim, porém, eu consigo achar que Londres é um lugar melhor do que São Paulo. Continuo morando na única grande cidade do mundo que está a apenas 5 horas de carro do Rio de Janeiro...
39 comentários