Minha crônica no Guia do Estadão de hoje.
De todas as invenções que deram errado, a que deu mais errado é, sem dúvida nenhuma, a torneira operada por célula fotoelétrica.
Toda vez que eu dou o azar de topar com uma delas, sou forçado a me lembrar de que a água limpa é um elemento escasso no planeta, de difícil extração. Eu, por exemplo, não consigo extrair um pingo sequer, quando a torneira é operada por célula fotoelétrica.
Eu sei como a coisa teoricamente funciona. O procedimento é simples e sem segredos, e pode ser descrito num passo-a-passo de fácil compreensão.
1) Aproxime-se da pia.
2) Instintivamente leve a mão direita ao lugar onde deveria estar aquele negócio redondinho e giratório que aciona a torneira (e que nós chamamos, com razão, de torneira, mesmo).
3) Ao não encontrar nenhum acionador de torneira, pense: “Droga! Outra torneira operada por célula fotoelétrica”.
4) Pouse a mão direita embaixo da torneira propriamente dita.
5) Dê tchauzinho para a célula fotoelétrica. O tchauzinho é a senha para a célula fotoelétrica liberar a água que vai lavar sua mão.
Viu? Eu sei muito bem como proceder. Só que nunca dá certo comigo. Pelo menos não de primeira. Nunca na primeira tentativa – e jamais na primeira pia. Todo banheiro com torneira operada por célula fotoelétrica torna-se um calvário pessoal: eu vou de pia em pia até que uma célula fotoelétrica caridosa resolva finalmente responder ao meu tchauzinho com um jato d’água.
O pior é que, quando vem a água, eu sempre levo um susto, e acabo me respingando todo – para delírio dos desocupados que resolveram ficar e se divertir às minhas custas.
O que me deixa mais revoltado é que a torneira operada por célula fotoelétrica não foi inventada para economizar água. Para isso já existe aquela outra torneirinha, com jato programado, que vem com um botão no alto do duto para você apertar.
Não, o mote aqui não é economia. A torneira operada por célula fotoelétrica foi inventada e é fabricada, distribuída e comprada por gente que basicamente tem nojo de você.
Sim. Essa gente está convencida de que a sua mão é um agente contaminador da maior periculosidade. E que nem o mais poderoso dos sabonetes será capaz de matar os germes que você ousou trazer a essa pia.
É bom eu ir me preparando. Depois desta denúncia, vai saber o que a próxima torneira vai despejar em mim depois que a sua célula fotoelétrica reconhecer o meu tchauzinho.
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