Minha crônica no Guia do Estadão de hoje.
Minha nova dieta chegou ontem por e-mail. E, conforme eu temia, os cardápios das próximas oito semanas não prevêem nem sequer um naco de melancia.
Antes que você pergunte de onde possa ter vindo essa dieta, eu digo: de uma ótima nutricionista, de carne e osso, que consultei uma semana antes, e que compõe os cardápios caso a caso (e sem remédio). Por isso a demora – e o e-mail.
Estou arrasado. Jamais pensei que um dia fossem me proibir de comer melancia. Depois de três décadas e meia entrando e saindo de dietas, eu imaginava que melancia fosse o alimento perfeito. Bem – talvez seja por isso que eu tenha passado esse tempo todo entrando e saindo de dietas.
Sei que não estou sozinho. Se você googlar a palavra “melancia” e a expressão “pouco calórica” vão aparecer centenas de resultados, de fontes idôneas e respeitáveis. Senhor, o que foi que eu fiz para não poder comer nem melancia? (Está bem. Eu sei o que eu fiz. Pulemos de parágrafo.)
Quem diria que uma, perdão, curcubitácea pudesse ser tão doce? Melancia é gostosa em todas as línguas. “Sandía” em espanhol. “Pastèque” em francês. “Cocomero” em italiano. E “slurpt nham nham” em boca cheia.
Melancia é rica em fibras. Não tem conservantes. Não leva gás. Não tem bicho que nem a goiaba. Sua casca não fere feito a do abacaxi. Pode enfiar o pé nela, que você não fica com ressaca.
Melancia não mudou de grafia com a reforma ortográfica. Tampouco precisou se fundir com nenhuma outra fruta por causa da crise. Melancia não está no Cade. A Sadia não passou os últimos vinte anos dizendo que a melancia da Perdigão não prestava nem a pau. Ao contrário do Unibanco, ela nunca disse por aí que nem parecia melancia.
E no entanto, aqui estou eu, sem poder transferir para a melancia a compulsão que até outro dia eu dirigia aos pudins de leite condensado e aos mil-folhas de padaria (dormidos, de preferência).
Sim, a essas alturas eu já entendi que é exatamente esse o propósito. Passei da idade da reeducação alimentar. Agora o caso é de reformatação do HD.
Devo esquecer o beabá que eu pensava que sabia sobre tudo o que engorda e o que emagrece. Quem manda agora são os alimentos funcionais. Descobri que, mesmo nos regimes que eu fiz, eu só comia comida “disfuncional”.
Não chores por mim, melancia. Se algum dia nos reencontrarmos, quem sabe eu também esteja gostoso.
Foto gentilmente surrupiada daqui.
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