13 de janeiro de 2005. Apesar do nosso hotel ficar em Chinatown, do outro lado da rua tem um templo hindu. Existe em outra parte da cidade um bairro chamado Little India, mas mesmo assim há pelo menos dois templos hindus em Chinatown. (E uma mesquita, também.)
Nesse templo defronte ao hotel acontece um ritual estranhíssimo – para não dizer hilário. Primeiro o fiel entra e some lá dentro do tempo. Dali a um tempo ele volta ao pátio de entrada com um coco na mão. Não o coco inteiro – só aquela bola encrespada que contém a água. Ah, sim: o coco vem com um pavio, que o fiel acende numa pira. Uma vez aceso o pavio do coco, o fiel usa o coco para fazer um defumaçãozinha rápida (de descarrego?) nele mesmo. Não, ainda não começou a parte hilária. A parte hilária vem agora: o fiel tira o pavio do coco, joga o pavio na pira e... põe-se a arremessar o coco contra o chão da entrada do templo, TAC, TAC, TAC, até espatifar: PLEC! E se depois você achar que o chão ficou muito congestionado de restos mortais de coco, você pega uma vassoura e procede a uma lavagem básica das escadarias de Lord Shiva.
(Não, não fotografei. Eu precisaria nascer de novo para conseguir chegar com uma câmera na frente de uma pessoa que, não contente em catar coquinho, acende o pavio do coquinho e fica jogando coquinho no chão até arrebentar.)
Para presenciar uma cena assim na Índia, o visitante tem que superar o calor, a poeira, os insetos e o assédio de mendigos, aleijados, candidatos a guia e condutores de riquixá. Em Cingapura não: aqui ninguém vem importunar você. Não há lixo na rua. Os táxis são numerosos e vêm com quatro rodas e motor. E você nunca está a mais de cinco minutos de algum ambiente com ar-condicionado.
Cingapura tem povos de três culturas – chineses, malaios e indianos – vivendo com a maior renda per capita de qualquer país do mundo situado nos trópicos. Antes da crise asiática de 98, a renda média em Cingapura tinha batido a da França – me deu uma preguiça danada de gloogar uma estatística mais recente, mas ainda hoje eles devem dar um banho na gente.
Existem lugares mais exóticos e autênticos, mas Cingapura é perfeita como primeira escala de um tour pelo sul e sudeste asiáticos. Se me encomendassem um slogan para a cidade, eu tacaria: "Ásia para principiantes". A propósito, Cingapura daria um ótimo infomercial. Tipo assim:
Antes de conhecer a Ásia de verdade, passe no nosso showroom: Cingapura! Visite templos chineses, hindus e muçulmanos! Você não precisa nem entrar em restaurantes: basta passar numa de nossas inúmeras praças de alimentação (veja a foto) e fazer a festa, misturando pratos chineses, malaios e indianos! Cuidado com a pimenta! Mas não deixe de experimentar nossa deliciosa cerveja Tiger! Passeie pelas ruas restauradas de Chinatown com suas lojas e restaurantes transadinhos! Sim, é mais bonito que Hong Kong! E não se esqueça! Nós podemos ser budistas, muçulmanos e hindus, mas nossa verdadeira religião são as compras! Passe num dos 26 shopping centers da Orchard Road e comprove com seus próprios olhos!
O que eu vim fazer pela terceira vez na vida num lugar que é a Ásia para... principiantes? Uma escala técnica. Eu precisava ir da África do Sul para a Austrália uma companhia da Star Alliance (e, quando eu comprei a passagem, a South African ainda não tinha entrado para a aliança). Eis que entra em cena aquela que talvez seja a melhor desculpa para alguém vir a Cingapura: a Singapore Airlines – uma companhia aérea que consegue ser tão melhor, mas tão melhor que as outras, que até na classe econômica a gente percebe a diferença.
5 comentários