Leitor apedrejado no Bus Turístico na Boca; fato não é incomum

Caminito, Buenos Aires

Eu costumo dizer que o bom de ir ao Caminito é que você nunca mais vai precisar ir ao Caminito.

Na minha opinião, trata-se do lugar mais desinteressante de Buenos Aires: é apenas um cenário, totalmente desprovido de qualquer significado que não o de servir para ticar da lista um lugar obrigatório de peregrinação. É um lugar que atrai apenas duas categorias de personagens: os turistas e seus exploradores.

Pois agora apareceu mais um motivo para não ir ao Caminito — ou, pelo menos, não ir pelo Bus Turístico. É que bandos de pivetes da Boca agora se divertem jogando pedras, ovos e lixo nesses ônibus.

O assunto já foi matéria do jornal Clarín, agora em março: El bus turístico es un éxito, pero les tiran huevos y basura a los pasajeros.


Seria de imaginar que, uma vez denunciado o fato, a prefeitura e a polícia tomassem as devidas providências. Nananina. Veja o triste relato do Fabio, que levou uma pedrada no pescoço e foi parar no hospital:

Acabei de voltar de Buenos Aires. Passei 4 noites lá com minha esposa e meus pais. Antes de viajar, planejamos tudo e estávamos informados à respeito de assaltos e tudo mais. Por isso, tomamos bastante cuidado e não tivemos problemas com notas falsas nem furtos. Tudo seria perfeito se não tivesse ocorrido o seguinte fato, logo no meu primeiro dia. Resolvemos fazer o city tour, como muitos turistas fazem. Não pegamos o do hotel, e sim fomos pegar o da rua, que é um pouco mais barato, mas é oficial da prefeitura da cidade e tem dois andares, sendo o de cima descoberto, que dá todo um tchan pra curtir a cidade. Vimos a cidade inteira e só resolvemos saltar no Caminito, pois não pretendíamos voltar lá de taxi, por ser um local “perigoso” e tudo mais. Saltamos uma estação antes (na frente da Bombonera), por conta de uma informação errada no itinerário fornecido, e tivemos que andar uns 3 quarteirões até o Caminito. Não tivemos problemas nesse trajeto de ida ao Caminito e volta ao ponto, fora os caras chatos dos restaurantes que ficam querendo te agarrar pra comer no deles.

Mas por incrível que pareça, não escapamos da violência. Esse ônibus do city tour da prefeitura é bastante esculhambado, eles param demais em alguns pontos, demoram pra andar, e o motorista mais uma vez resolveu parar num ponto que parecia desativado, numa das ruas não turísticas da Boca (me parece que existem 3 pontos do city tour da prefeitura no bairro), para almoçar (comprou empanadas num restaurante). Logo antes dele parar no maldito ponto, escutamos um barulho de pedrada, e duas moças brasileiras que estavam sentadas atrás de nós disseram timidamente que meninos da rua haviam jogado uma pedra no ônibus. Imaginei que fossem moleques brincando de jogar pedra no ônibus, e não nas pessoas, pois é o tipo de molecagem que crianças pobres no Brasil costumam fazer. As meninas resolveram sair dos bancos do lado da rua e foram pro outro lado, mais à frente. Eu e minha esposa, na nossa ingenuidade, permanecemos sentados, com meus pais à frente, que não haviam percebido nada por conta dos fones de ouvido que ficam explicando o city tour durante o passeio. Simplesmente não acreditamos que as crianças pudessem fazer o que em seguida fizeram. Depois do motorista pegar suas empanadas e andar com o ônibus, uma criança que possivelmente atirou a primeira pedra (era um grupo que se escondeu depois da primeira) reapareceu do nada e me acertou com uma pedra enorme atrás da cabeça. Tive que levar 3 pontos na cabeça e gastamos uma nota num hospital particular, com medo de enfrentar mais sofrimento no hospital público da Boca que haviam nos sugerido. O motorista do ônibus e a “cobradora” fizeram uma cara de idiotas quando descemos e reclamamos do ocorrido, e sequer se ofereceram de nos levar ao hospital ou chamar a polícia no local. Seguimos até próximo ao Puerto Madero para pegar um taxi e ir ao hospital. Apesar disso, não abrimos mão do resto da viagem e aproveitamos muita coisa boa da cidade, assim como muitos porteños nos trataram bem e foram gentis, incluindo taxistas.

O que quero com esse comentário é recomendar que NINGUÉM vá aos bairros pobres da cidade, especialmente o La Boca. A prefeitura da cidade simplesmente não faz o menor esforço pra proteger os turistas, colocando o ônibus oficial de city tour fazendo esse trajeto, e ainda nos expondo ao risco, parando o ônibus nessas ruas desertas. O ônibus é lento demais, nos faz perder tempo de tantas paradas e filas para subir nele nos pontos principais da cidade, e ainda nos causou esse prejuízo de ter perdido 4 horas da viagem indo ao hospital, pagando uma fortuna pelos pontos e por uma injeção anti-tetânica, aguardando atendimento (mesmo pagando caro) e engolindo essa agressão gratuita.

A lição que nos fica é sempre sermos hiper cautelosos, não ter vergonha de gritar por ajuda e se abrigar num lugar protegido ao menor sinal de agressão, sejam xingamentos, pedras ou tiros. E nunca perder tempo visitando bairros carentes que não sabem tratar bem seus turistas. Fomos humildemente no Caminito, pagamos conta de restaurante, demos gorjeta, compramos águas, fizemos nossa parte pra contribuir pelo desenvolvimento local, e somos agradecidos levando pedradas. Entendo que pessoas sofridas muitas vezes retribuem com atos violentos a violência que lhes é cometida, mas acho um absurdo que a prefeitura da cidade não tenha percebido que estará perdendo muito dinheiro expondo os turistas à uma região que eles não podem garantir a segurança. Fico imaginando o que pode acontecer com alguém que resolva ir assistir um jogo na Bombonera ou ir nos bares e restaurantes da Boca de noite, sinceramente recomendo que não façam isso, o que aconteceu comigo foi tão gratuito que não quero nem imaginar o que aconteceria se alguém fosse lá ingenuamente com uma camiseta de outro time de futebol ou fizesse qualquer coisa que pudesse servir de argumento pra alguém lhe agredir.

Fabio, não ponha isso na conta de rivalidade entre países ou de rixas de futebol. É brincadeira de pivete que deveria ser reprimida e não é.

Outra lição a ser tirada deste caso: viaje sempre com seguro-assistência, mesmo se você for até ali pertinho. É barato e poupa você de perrengues na hora em que está fragilizado.

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109 comentários

“Eu costumo dizer que o bom de ir ao Caminito é que você nunca mais vai precisar ir ao Caminito.”.
Essa frase é a cara de Riq e é a melhor definição do Caminito!

Fico triste com essa notícia, pois sou muito fã da capital portenha.

Loraine.
Que pena que Buenos Aires parece não ser mais a mesma. Acabei de voltar do Chile e achei ótimo: pessoal bem receptivo, educado. Cidade organizada e limpa. Preços justos. Pode ir sem medo.

Acabei de voltar da minha terceira viagem a Buenos Aires e concordo com relatos anteriores, achei a cidade mais degradada, suja e insegura. Também achei o preço dos restaurantes muito mais altos e dispostos a tudo para tirar mais dinheiro dos clientes. Entrei em restaurantes que tinhamos que pagar 7 pesos por pessoa para poder utilizar azeite, vinagre e sal. outro cobrava um valor específico pelo “seviço de mesa” e mesmo assim tínhamos que dar gorjetas ao garçon, que demonstrava, imediatamente ao receber o valor da conta a sua satisfaçao (OU NAO) frente ao valor ofertado. Durante o show de tango Esquina Carlos Gardel,o garçon me interrompeu, no meio do espetáculo, para avisar sobre a necessidade de pagar a sua gorjeta, além do pagamento antecipado do show que já havíamos feito…Enfim, me senti extorquida inúmeras vezes, de forma extremamente grosseira. Garçons ou vendedores portenhos grossos sempre existiram, mas atualmente, noto que esses níveis superaram a civilidade…Decidi dar um tempo de Buenos Aires, espero que o Chile acolha melhor seus visitantes.

Buenos Aires “é bão”, o Caminito “é bão” e “o mundo é bão, Sebastião”. Ruim mesmo são algumas pessoas. Então estamos sujeitos a levar pedrada, ser esfaqueado ou tomar um tiro, na calçada, no barzinho ou no trânsito. E se você acreditava que uma escola seria o lugar mais seguro para o seu filho estar, seja no Rio ou em Columbine, certamente refletiu bastante sobre isso. Prudência é uma ótima virtude, em excesso vira pânico e paranóia. As tragédias existem e somos gratos por viver (ou as vezes, sobreviver). Então visite Buenos Aires e todos os outros lugares do mundo que queira conhecer e agradeça por poder fazê-lo. Ao Fabio e aos demais que passaram por problemas similares, fico feliz que estejam bem, apesar de tudo. A vida é uma viagem, aproveite!

    Wanderson, a questão não é adotar a paranoia total e se trancar no meio de uma casa com muros de 40 metros e pontes móveis com jacarés lá embaixo, mas sim alterar a percepção geral de risco de Buenos Aires.

    O VnV presta um excelente serviço ao postar esses relatos, ajudando a desmistificar, para o público brasileiro, a ideia de que Buenos Aires é limpa, segura e relativamente barata – podia ser em 1989, nào em 2011.

    Olha Andre , sinceramente nunca achei BUE mais limpa, mais segura ou mais barata do que tantos outros lugares.
    O que ocorreu durante a guerra das Malvinas ( e eu estava lá ) é que ficou ridiculamente barata , mas em compensação o baixo astral era geral ; depois nos 2000 passou a ter uma boa( as vezes ótima) relação custo beneficio pra turistar; mas tem montes de lugares assim pelo mundo , como Lima nos dias de hoje ; e Bali, e o Marrocos e alguns lugares na Grecia, na Turquia , o sudeste da Asia em geral …
    A questão reside basicamente na comparação : era assim, foi assim, está assado.
    Expectativas irreais e comparações ( passado x presente) estão sempre presentes nas andanças.
    Nós aqui a 1,30h de voo de Bue ,continuamos a passar semanas por lá e acompanhamos as mudanças da cidade cada vez com maior prazer.

Li em um jornal que uma briga politica entre o governo federal e a prefeitura ( ou província, não sei ao certo ) de Buenos Aires fez com que o governo federal retirasse todo seu efetivo policial da rua – que antes era responsável por parte importante do policiamento. A prefeitura de Buenos Aires está assumindo sozinha a segurança, e os frutos, imagino, estamos vendo. Minha solidariedade, Fabio. Parece também, que com o incremento da criminalidade, hotéis e prédios de interesse turistico têm contratado segurança particular ( copiando o nosso pior lado ).

Fico muito triste com estes relatos, e sinto muito que o Fabio tenha passado por isso. Mas é preciso lembrar que Buenos Aires é uma metrópole sul americana, não é Suiça ou Dinamarca. O turista não pode ir pra lá pensando que chegará em um paraíso sem problemas sociais, de violência, corrupção ou descaso policial, bairros pobres, etc. É uma cidade enorme, com problemas enormes, e estes problemas são enfrentados por TODA a população. Não, não é perseguição ou algo exclusivo contra brasileiros. Todo o porteño sofre com a escalada dos preços e da violência. Agora, estes fatos tristes não devem ser generalizados e usados como argumentos de teorias da conspiração contra brasileiros. Ou será que o turista estrangeiro quando visita o Brasil não sofre também com violência, descaso e corrupção policial, preços abusivos, etc? Em relação ao Caminito, não vou lá desde 2004 e não pretendo ir tão cedo. Fico muito triste com a criação de um bolsão turístico em uma área pobre e sofrida. E garanto que os gastos que os turistas fazem lá não ficam no bairro não, a renda do turismo não é revertida para a região ou comunidade. Ao visitar BsAs, não se sintam em terras nórdicas ou canadenses. Lembrem-se que vocês estão na América do Sul, com todas as coisas lindas e maravilhosas que nosso continente oferece, e também, infelizmente, com todos seus problemas…

Já contei aqui, nao me lembro em qual post,sobre um city tour em Nápoles, nestes mesmos ônibus abertos, de crianças jogando pedras de cima de uma ponte! Por sorte ninguém se machucou. Foi tão rápido e irreal , que não nos preparamos para o fato. Li na Folha de SP, há algum tempo que no Rio assaltantes fazem o mesmo(muito pior, na realidade), jogaram uma tampa de bueiro numa professora para assaltá-la(no carro). Ela ficou em coma um tempo enorme e luta para reconstruir sua vida, cheia de sequelas.Lamentável.

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