Ilustração | Daniel Kondo
Alguns 25 de janeiros atrás, o Jornal da Tarde me pediu uma declaração de amor a São Paulo. Eu dei. Disse que São Paulo era uma cidade muito melhor que Nova York, Paris, Londres ou Roma, porque nenhuma delas tinha vôos a cada meia hora partindo para o Rio de Janeiro.
Mesmo que você não sinta tanto amor assim pelo Rio, haverá de concordar que, num dia claro, a Ponte Aérea é um deslumbre. Tenho motivos para desconfiar que seja o mais bonito voo de jato do planeta. Sente-se numa janelinha do lado direito, e você verá a Rio-Santos sendo esculpida debaixo do seu nariz.
Infelizmente, a Ponte Aérea deve ser hoje também o vôo mais caro do planeta. Compre uma passagem na véspera, e pelo preço da ida e volta em horário nobre você poderia ir a Miami. A coisa chegou a um ponto tal, que torrar milhas para pegar uma Ponte de manhã cedo ou no fim da tarde já virou um ótimo negócio.
Corta para flash-black. As imagens ficam em preto e branco. Aparece letreiro: 1986.
Pense num aeroporto pacato: era Congonhas. Nos balcões de check-in só havia duas filas: para quem tinha e quem não tinha reserva. Só 30% dos assentos eram reservados; os outros eram distribuídos por ordem de chegada. Uma placa sobre o balcão anunciava o próximo horário disponível.
As passagens valiam por um ano. Toda secretária de executivo graduado tinha na gaveta um bolinho de tickets emitidos no nome do chefe. Nunca dava saber por que companhia você voaria: seu bilhete da Varig valia também na Vasp ou na Transbrasil.
Você entrava na fila e trocava seu bilhete preenchido com caneta esferográfica (em três vias com carbono) por um cartão de embarque plastificado, com bordas carcomidas. A cor do cartão (vermelho desbotado, verde desbotado, azul-calcinha desbotado) indicava o horário do vôo.
A sala de espera era um clube de engravatados e (raras) mulheres de tailleur que se conheciam ao menos de vista. E o vôo, à hora que fosse, estava mais para um happy hour, regado a scotch, vodca e vinho. Dava até para fumar. Sim, a gente estava em Mad Men e não sabia.
Pelo menos a paisagem na janelinha continua linda. Milhas, pra que te quero?
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