Pitacos: como fazer de 2014 a Copa do turismo

Praia do Espelho -- um bom lugar para descobrir o Brasil

(Publicado originalmente na minha página Turista Profissional, no Estadão.) Mesmo sendo eliminado da Copa da África do Sul nas quartas-de-final, o Brasil não deixou de ser um dos gigantes do futebol. Mesmo que não fature o caneco em casa, em 2014, não perderá seu posto de maior campeão de todos os tempos (no máximo pode ser igualado pela Itália). Na Copa do Mundo de 2014, o que estará em jogo para o Brasil é a chance de se tornar grande no turismo internacional.

Com apenas 5 milhões de visitantes estrangeiros, o Brasil tem um terço do turismo internacional da Tailândia e metade do da África do Sul. O que isso afeta a você e a mim? Sem realizar o seu potencial, a indústria do turismo brasileiro não ganha escala suficiente, e os preços (já prejudicados pelo câmbio e pelo custo Brasil) permanecem altos. O prejuízo da sociedade é ainda maior, porque o turismo é o melhor empregador (e treinador) e de mão-de-obra local e pouco qualificada; é o tipo de atividade que consegue capilarizar mais rapidamente seus resultados.

2014 é uma oportunidade única, porque a festa da bola vai se realizar não só no país da bola, como no país da festa. É relativamente fácil convencer o mundo de que não dá para perder a oportunidade de estar aqui em algum momento do evento. Aqueles quatro dias impossíveis de reservar no carnaval do Rio de repente se transformarão em 30 dias que podem ser curtidos em qualquer lugar do país.

Discute-se muito o que vai ser dos estádios depois da Copa. Mas o grande legado que 2014 pode dar ao Brasil é finalmente abrir os portos ao turismo internacional. Aqui vão alguns pequenos pitacos.

Desvincular a Copa dos ingressos

A Copa do Brasil precisa ser mais parecida com a da Alemanha, quando a viagem valia mesmo para quem não tinha ingresso na mão, do que com a da África do Sul, que só se materializava para quem conseguisse estar no estádio. A Fifa provavelmente impedirá o uso da palavra e da marca Copa em cidades que não sejam sedes, mas o Brasil precisa ser criativo e estender o “clima de Copa” a todos os lugares turísticos. Isso já acontece normalmente por aqui, não importa em que canto do planeta a Copa se realize. Numa Copa em nosso território, será ainda mais natural.

As cidades e estados sem-Copa podem – devem – decretar carnaval fora de época. Um carnaval de festas, de eventos, de oportunidades para quem quiser descobrir o Brasil e compartilhar esse momento único com os brasileiros. É bem possível, tendo em vista as dificuldades de infra-estrutura e logística das cidades-sede, que os turistas estrangeiros aproveitem mais a Copa fora dos estádios. Pode ser a doce vingança das cidades preteridas.

Encarar a Copa como investimento de marketing

Que hoteleiros, companhias aéreas, operadoras e agências de receptivo lembrem-se do Réveillon do Milênio. Devido ao câmbio e aos impostos, o Brasil já é um país caro; exorbitar nos preços não vai levar a lugar nenhum. A Copa de 2014 vai se realizar numa época de baixa e média temporada – estar de casa cheia já vai ser uma novidade para a maioria dos “players”. Não é hora de espantar, mas de atrair um público novo, que pode trazer muita gente mais – e, com o tempo, tornar a indústria do turismo menos dependente do turista doméstico e das férias escolares brasileiras.

Oferecer soluções na internet

Se hoje boa parte das viagens já são decididas pela internet, em 2014 não haverá outra maneira de viajar. O turismo brasileiro ainda não sabe se vender na rede – nem mesmo para o viajante brasileiro, que dirá para o estrangeiro. A Copa pode ser um bom catalisador para que as coisas aconteçam. Se o candidato a visitante encontrar fácil na internet pacotes, hotéis, passagens de ônibus e avião – alô, companhias aéreas: que tal unirem esforços para fazer um Air Pass? –, será bem mais fácil concretizar a sua viagem.

Fazer a maior festa de todos os tempos

Dominamos totalmente o know-how das grandes celebrações. Fazemos festas incríveis sempre que queremos. A Copa de 2014 vai ser mais uma delas – e pode ser a mais inesquecível de todas. Basta termos em mente que, desta vez, não seremos apenas participantes: seremos anfitriões. E precisamos receber bem a todos – incluindo milhares de argentinos (e uruguaios, paraguaios, chilenos) que deverão invadir o Brasil por terra. O mundo já aprendeu a gostar do Brasil dentro do campo. Chegou a hora de mostrar que fora dele também podemos ser campeões.

28 comentários

A Fonte Nova vai ser implodida no domingo. E pelo módico preço de 1,6 bilhões pagos pelos contribuintes um novo estadio será erguido.

Em área urbana, o maior é a APA Parque das Dunas – 1.800hectares de restinga e dunas( 16 lagoas, a lagoa Vitória maior que Abaeté).

Andre Lot, “as duninhas” que você refere são o maior sistema de dunas e restingas em área urbana do país.Como era previsto, a Infraero não conseguiu o licenciamento ambiental para construção nova pista do aeroporto. Nova pista, só em outro local, provavelmente fora do município de Salvador. Já é decisão oficial.

    O maior sistema de Dunas não são as do Parque das Dunas em Natal?

    Enfim, a discussão ficou para o offtopic imensamente, e eu nào vou me alongar aqui e encerro por agora, mas digo que eu sou um opositor ferrenho dessa política ambiental tola em vigor no Brasil, que permite caminhões exalando fumaça preta com motores da década de 1970, que tolera esgoto lançado in natura nos rios do país inteiro, mas que ao mesmo tempo vê qualquer conversão de mato em área agrícola produtiva como “um crime ecológico” e se opõe a obras de infra-estrutura essenciais para o país como aeroportos, novas e modernas rodovias, hidrelétricas novas áreas agrícolas com tecnologia de primeiro mundo etc. etc. Até faço parte de um grupo dedicado a minar esses esforços dos ecochatos de plantão no Brasil. Temos obtido alguns sucessos com propaganda direcionada e argumentos feitos combater o discurso algumas vezes exagerado dos Greenpeaces da vida.

    Para mim, o caso mais emblemático recente é o de uma duplicação pertinho de S. Paulo, da famigerada BR-116 até Curitiba. Por causa de um bando de papagaios qualquer, um pedaço da obra foi atrasada em quase 1 ano e meio, e nesse período 11 pessoas perderam a vida em acidentes no trecho em questão. Salvam-se os papagaios, lagartos, montes de areia e plantas, e nós, humanos, que fiquemos com os cognestionamentos, acidentes, mortes, caos aéreo (= estresse + problemas do coração + perde de produtividade e tempo etc) e por aí vai.

    Desculpem o desabafo. Prometo parar por aqui.

    ==========
    Retomando a temática Copa do Mundo, acho que o principal imapcto duradouro pode ser o da imagem, da “marca” Brasil. Os gastos dos turistas estrangeiros DURANTE a Copa serão importantes, claro, mas nem de longe têm o potencial multiplicador de um bom trabalho de marca, divulgação, boca-a-boca e propaganda bem direcionada que PODE ser feito utilizando-se essa overdose de exposição internacional que ocorrerá por conta de Copa e Olimpíadas.

    Mas em termos de atrair turista estrangeiro, se usarmos a Copa como mote para treinarmos pessoas envolvidas com turismo para atenderem o turista estrangeiros, já será uma BELA contribuição duradoura. Não se trata apenas de ensinar idiomas estrangeiros (embora isso seja importantíssimo), mas preparar a cadeia do turismo para lidar com alguém que está em “terra estranha” sem vê-lo como um cofre de dinheiro a ser explorado a cada esquina, com tarifas de hotel “diferenciadas” que fazem câmbio 50, 60% mais caro, garçons capazes de expliar pratos decentemente em inglês, roteiros e passeios interessantes-mas-não-pedantes e por aí vai.

    Se a África do Sul, com violência como a nossa, tensões sociais, desigualdade, distância de acesso aos principais mercados emissores comparáveis às nossas, conseguiu se inserir no mercado, temos condições de fazer isso também.

Já a segurança é um dos problemas que menos me preocupa, até o Pan mostra que é relativamente fácil criar um esquema que funcione durante um evento, a propria África do Sul conseguiu segurar as pontas por alguns dias, e se tratando de Johannesburgo não é pouco.

Ainda tive a impressão que nas últimas copas e olimpíadas os efeitos positivos para o turismo foram menores e menos duradouros que o inicialmente esperado, embora isto não seja necassariamente regra, o problema é que normalmente colocam as expectativas muito lá em cima e divulgam projeções infladas.

Não torço contra, mas estou cada vez mais pessimista com a copa e as olimpíadas, o Brasil segue a tradição de fazer tudo em cima da hora e sem palenjamento, assim sobram obras de má qualidade e superfaturadas, como infelizmente devem ser todos ou quase todos os estádios. Por outro lado, o trânsito do Rio que está cada dia pior (nos dois últimos finais de semana mofei como nunca na 101 e na Dutra para sair da cidade, com movimento de final de semana normal e não de feridão) pois enquanto o número de carros aumenta assustadoramente o único investimento em estradas se dá por meio de recapeamentos mal feitos e intermináveis (quando interditam faixas mínimas e criam congestionamentos quilométricos nos horários de rush) e novas praças de pedágio para roubar a população (uma viagem de carro que a 5 anos fiz em duas horas e sem pedágio, ontem durou cinco horas e com dois pedágios, um dos pedágios visivelmente responsável por um enorme engarrafamento, nas duas situações separadas por cinco anos percorri o mesmo percurso num domingo de um final de semana comum com tempo bom), fora das estradas então nem investimento tem, a situação dos aeroportos já é uma vergonha anunuciada e a rede ferroviária não existe… Mas é claro que quando chegar a copa a “operação maquiagem” vai criar faixas exclusivas, pontos facultativos e desencorajar viagens da população para facilitar o deslocamento das delegações, e depois a vida da população continua na mesma m de sempre se não piorar. Dois anos (!!) depois vem mais um show de maquiagem e superfaturamento com as olimpídas, só resta esperar que não deixem o país quebrar como a Grécia. Cada vez mais concluo que copa e olimpídada só trazem benefícios concretos para países em boa situação econômica e com grandes reservas (o que segundo alguns o Brasil atenderia, mas não concordo pois nosso crescimento não é sustentável e o endividamento interno é exorbitante), alta qualidade de vida e mínima corrupção, nos demais casos só ajuda mesmo a encher os bolsos de governantes corruptos, empresas “bem relacionadas” e apadrinhadados. Em Chicago teve até movimento contra as olimpíadas, lá eles sabem que o evento pode trazer mais problemas que soluções. Apenas minha opinião, alguém que já se acostumou a ver quase tudo de bom que os governantes prometem virar abóbora depois, entendo que para o pessoal do turismo as expectativas estejam mais elevadas.

Adorei o texto! Essa questão da infraestrutura, se pudesse ser resolvida, se refletiria em todos os aspectos da nossa vida e a Copa seria uma ótima oportunidade. Esse seria o grande benefício deixado pelos jogos. Logística de transporte melhor, preços melhores, maior crescimento da economia. Imaginem, não é só turista ou passageiro que utiliza o que está aí. Navios chegam a ficar 15 horas parados, em média, esperando p/ descarregar no Porto de Santos, daí os navios preferem rumar p/ Buenos Aires e a mercadoria chega p/ gente por terra. Estendam o exemplo p/ outros setores e meios de transporte. Tem lógica isso?

Tem toda razão Riq, também estou muito otimista com a oportunidade do Brasil em 2014. O turismo pode criar empregos definitivos para mais brasileiros, ao contrário da construção civil, por exemplo. E pra quem acha que a indústria do turismo só oferece empregos de baixa renda (garçom, recepcionista, etc), é legal lembrar que Búzios ou Trancoso, por exemplo, eram vilas que só ofereciam a pesca como atividade econômica para seus habitantes, há poucos anos. Uma atividade muito mais cansativa e mal remunerada.

    Então, como atividade econômica o turismo é uma atividade com duas facetas. Por um lado ele possibilita isso que vc citou – diversificação de atividades para lugares antes paupérrimos -, mas por outro lado o turismo de alta intensidade (relativa, seja um lugar dominado pela CVC como Porto Seguro, seja um destino ecológico dominado por operadoras “verdes” como Bonito, seja uma “Meca” de mochileiros como Macchu Picchu acaba gerando alguns efeitos colaterais como alta sazonalidade, serviços públicos ruins (nenhuma cidade de Terceiro Mundo consegue pagar sua infra-estrutura para funcionar redondinha só durante 4 meses do ano e ficar ociosa nos outros 8) e por aí vai.

Só gostaria de ressaltar que os efeitos para o turismo serão imediatos, e que logo depois teremos as olimpíadas no Rio, que pode bombar ainda mais se a copa for bem feita. Acho que nunca antes na historia de olimpiadas e copa, elas foram realializas em sequencia no mesmo pais.

Atenção: Os comentários são moderados. Relatos e opiniões serão publicados se aprovados. Perguntas serão selecionadas para publicação e resposta. Entenda os critérios clicando aqui.

Assine a newsletter
e imprima o conteúdo

Serviço gratuito