Ame-o e/ou deixe-o

ameo

Um papo bem interessante surgiu, neste fim de semana, na caixa de comentário de um post do mês passado sobre a Amazônia.

A discussão foi desencadeada por essa provocação da Dani G.:

Por que o brasileiro economiza pra conhecer as Zoropas e os Isteites, e acha que conhecer o Brasil com CONFORTO é caro? Por que gastar 3000-5000 euros pra conhecer a Europa ficando em hotéis mais-ou-menos é aceitável, e gastar 2000 reais pra conhecer o BRASIL é caro ?

Vejam bem, eu não acho turismo no Brasil barato, mas eu não entendo a PRIORIDADE que dão na hora da escolha… é mais chique dizer que foi a NYC do que até Manaus ou Alter-do-Chão, por exemplo? O que é mais importante? Conhecer os valores da sua terra, ou enaltecer as belezas do vizinho?

Imediatamente o post ficou quentíssimo, com muitas contribuições interessantes.

Para a Sylvia, “o Brasil vai estar sempre aqui”. Por isso aproveitamos para viajar para fora sempre que a ocasião se apresenta (na juventude, porque temos mais tempo de férias e mais disposição para encarar qualquer parada; agora, quando as passagens baixam ou o real se valoriza). No caso dela, ter deixado para visitar o Brasil depois de ter percorrido o mundo não alterou o resultado: “meu credo é viajar”.

A Dani retrucou: “Da mesma forma que o Brasil continua ‘aqui’, a Europa, Caribe e USA continuarão ‘lá’. O enriquecimento cultural de quem passa 30 dias mochilando na Europa é maior do quem fica 30 dias mochilando no nordeste, por exemplo? Não sou ufanista e nem estou saudosista, mas antes de meter a cara no que chamam de ‘mundo’ eu visitei o Brasil. E, aqui no chamado ‘mundo’ posso conversar com X,Y z Z dizendo que no Sul é assim e no Nordeste é assado. Acho a coisa mais triste alguém te perguntar peculiaridades do seu próprio país e você não saber informar, e ao mesmo tempo sabe de cor todos os pontos turisticos de Paris…”

No que a Mô, que detesta praia e mato, e já foi a quase todas as capitais brasileiras a trabalho (e voltou por conta própria a Belém e Manaus), foi direto ao ponto: “Gostoso é ir para aonde temos vontade e não para aonde acham que deveríamos ir. Como não sabemos jamais o dia de amanhã, no momento eu curto mais ir para aonde sempre tive vontade e não podia. O que há de errado nisso?”

Concordando com a Dani, a Carla2 encontrou traços culturais na preferência brazuca por viagens ao exterior: desde a colônia as classes abastadas mandavam seus filhos estudar na Europa; e no Sul e no Sudeste quase todo mundo tem origens européias mais ou menos recentes para conferir.

A maior declaração de amor às viagens dentro do Brasil veio da Flavia Penido, nossa LadyRasta: “Acho que tem dois fatores aí: a) preferência por um ou outro lugar; b) o conceito do que é viajar para você. Eu acho importante conhecer o nosso país até para conseguirmos saber quem nós somos, ou o que nos torna brasileiros; mas é um conceito meu. Como a Sylvia, acho que não importa o que se vê antes ou depois; mas como a DaniG, acho sim que as pessoas dão mais valor para o exterior do que para o Brasil. Eu até poderia dizer que isso advém de termos sido colônia, mas os EUA, por exemplo, não são assim — americano conhece normalmente os EUA antes de ir para a França ou para o Caribe. Sem dizer o que é melhor ou pior (não é isso em absoluto), acho que essa preferência pelos roteiros ao exterior tem um pouco a ver com a nossa baixa auto-estima sim. Que, paradoxalmente, só vai melhorar quando nos conhecermos. E para nos conhecermos…temos que viajar aqui dentro…”.

Meu pitaco: eu acho que a gente gasta dinheiro demais para viajar no Brasil em momentos errados (Réveillon e Carnaval), e gasta tempo demais reclamando de preços praticados em lugares remotos, de logística complicadíssima, como hotéis de selva e Fernando de Noronha, que seriam caros em qualquer lugar do mundo. Ao mesmo tempo, pouca gente está realmente ligada em descobrir as barbadas da baixa temporada — quando, sabendo para onde ir, o Brasil é uma pechincha.

Endossando a Dani, acho que a gente só considera um bom negócio viajar por aqui mesmo quando o Brasil está MUITÍSSIMO mais barato do que ir para o Exterior. Se custar só um pouquinho mais barato, o Brasil está caro

Também acho que normalmente temos dois padrões distintos de conforto. Como aqui somos da casa-grande, não admitimos nada que pareça remotamente senzaliano. Já quando turistamos fora, topamos qualquer parada… Dificilmente ficaríamos em Copacabana num hotel equivalente aos que ficamos em Paris ou Roma (para citar três cidades de hotelaria ultrapassada e cara).

Aos “fatores culturais” apontados pela Carla2 e pela Flavia,  eu acrescento mais um: a instabilidade econômica e monetária do Brasil, que faz com que a moeda passe alguns anos supervalorizada e outros tantos sem valer nada. É natural que a gente não queira perder a oportunidade de viajar para fora quando isso é possível.

Por isso, no final das contas, estou com a Mô — a gente deve ir para onde tem vontade e está podendo :mrgreen:

(Só acrescentaria: desde que numa época favorável, hehe.)

E você, o que acha? Concorda com alguém aqui? Discorda? Muito antes pelo contrário?

Ajude a engrossar esse caldo, pufavô!

132 comentários

Riq,

Voltando aos velhos hábitos!
Estive afastada de computadores, por motivos particulares. Qual minha surpresa ao entrar no Viaje Aqui e ver que havia se mudado. E então vim visitar sua casa nova. Que linda que ela é, cheia de luz, cheia de liberdade, sem censuras (no bom sentido!). Você voltou a ser o Riq que aprendi a amar, com as idéias e palavras soltas, alegre. Vejo-o como um passarinho que ganha a liberdade, pois no seu antigo enderêço percebia-se que não tinha encontrado o que procurava (talvez seja herança de nossos costumes BBeanos, onde corríamos o Brasil inteiro, a procura do eldorado!).
Estou “vasculhando” todos os cantos de sua nova casa, desde o dia da mudança, e vejo que está feliz. Bom vê-lo assim. Que o sucesso continue sempre ao seu lado.
Beijos.

Helenice

    Bem-vinda de volta, Helenice!

    E obrigado pelas palavras 😳

Riq, concordo com todo mundo…

…desde que venham pra cá, purfavô!

Lafayette, de Belém-Amazônia-Brasil

Há alguns dias conversando com alguns amigos sobre meu destino de férias – a decisão estava entre NY ou Pipa / Norte de Alagoas – ouví a seguinte fala: “_Não acredito que você não vai para a Europa? Eu, se tivesse esse dinheiro para ir para o Nordeste e ficar em pousadas de luxo, iria para a Europa!” Felizmente, em vez de dar uma respostinha atravessada para meu querido amigo, expliquei que conhecer cada dia mais o meu país era, para mim, um prazer. Tanto que repetirei a dose da Rota Ecológica em junho (será que vai chover muito? O Christian, da Pousada Patacho, disse que sim, e que eles estarão em férias coletivas…que coisa. Queria ir de novo lá. Agora acho que vou apostar na Beijupirá e na do Toque).
Aproveitei para dizer que a qualidade e o nível que o Nordeste tem apresentado em suas novas pousadas, não perdem em nada para o que é divulgado e vivido no exterior. A diferença é que aqui você é um dos brasileiros em uma praia virgem nunca d’ante visitada. No exterior você é “mais um brasileiro” na 5th Ave. ou na Champs! Não desmerecendo NY ou Paris, até porque NY é meu destino em outubro. Esperemos que as pessoas entendam o conceito da Hospitalidade e da troca valorosa entre hóspede e comunidade/proprietário da pousada/funcionário da pousada. Momentos certamente inesquecíveis.

Marilia, com certeza o turismo deveria ser uma das principais industrias do Brasil devido ao grande potencial que ainda não é explorado. Que o turismo gera toda uma cadeia produtiva é um fato pacífico. Assim como a indústria calçadista de Campo Bom, RS também, nem por isso as pessoas deixam de comprar seus sapatos chineses mais baratos. Talvez a ironia por trás do comentário foi lida sem ironia. O que eu quero dizer é que muitas vezes um discurso nacionalista pode ser superficial e ilógico, pois não estamos atentos ao impacto total das nossas ações. Eu sou um grande defensor do turismo responsável, que o André Lot menciona. Muitas vezes atacamos o problema de forma errada. Por exemplo, as ONGS que são contra a caça de gorilas na Africa não entendem que se não se criar uma alternativa de renda para a população que vê nos gorilas o potencial economico que a gente vê no gado, o problema não será resolvido.Convencer um morador local que O melhor dessa discussão é que começamos em um aspecto e estamos terminando em outro. Hipertexto total. Eu sou apenas contra a idéia que quem viaja para o exterior desvaloriza o local. É uma idéia um tanto ultrapassada e nacionalista/populista. Nessa linha de raciocínio, quem prefere bebidas de outros países, literatura, música, filmes, roupas, etc deixa de valorizar o Brasil? Claro que não. Devemos nos preocupar com o destino dos nossos Senadores e suas passagens. Eles sim devem ficar apenas no País. Mas esta discussão, além de interessante,é essencial, pois muitas pessoas não viajam no Brasil por desinformação e preconceito. E a indústria do Turismo não ajuda nem um pouco. Vocês não acham que no nosso país o Ministério do Turismo deveria ser tão importante quanto o da Cultura, Fazenda, etc? Claro! E se este tipo de blog, com este alto nível de discussão ( coisa que falta nos nossos plenários!) conseguir ajudar a diminuir o preconceito em relação ao turismo doméstico, ótimo! E com certeza conseguiremos, pois o nível da discussão é altíssimo. Um debate de idéias, sem nenhum ataque pessoal! Isso é raro!

Marília, vc tem razão. No caso de Fortaleza, por ex, eu não levo minha filha pra Beira Mar, local que todo turista freqüenta. E na primeira vez que ela foi à Praia do Futuro, com 6 meses, onde ficou até umas 10h da manhã, a mesma barraca sofreu um arrastão às 15h da tarde. Não deixei de ir a praia, mas vou pra barracas menos turísticas. Resumindo seu pensamento, a ignorância é realmente a mãe da felicidade.

Hoje consegui ler tudo. Discussão de altíssimo nível. Adorei os depoimentos, as discussões, os pontos e contrapontos.

Curiosamente, preenchi meu pedido de visto para os EUA recentemente e lá eu tinha que declarar os anos em que estive nos EUA – 2002, 2004, 2005, 2008, país que nunca fiz questão de conhecer (sempre adorei cultura e história européias). Mas já que mestrado, trabalho e milhagem me levaram, aproveitei!

Algumas pessoas falaram sobre o fato de estarem indo para mais longe por que os filhos hão de chegar um dia, o que é meu caso, e concordo. Porém hoje pensei, puxa, se eu tô programando Malásia para 2012, como eu vou para lá se tiver filho? Ao que imediatamente pensei: ufa, o Jorge Gira escreve sobre viagem com crianças, outros já viajam, até lá alguém me diz se dá para ir a Malásia com criança.

Ou seja, para o Brasil ou para o exterior, sozinho ou acompanhado, com ou sem filhos, o comandante e a tripulação estão aqui…inclusive debatendo em tão alto nível temas como esse – Brasil ame, fique, deixe, volte ou não, faça como desejar!!! 😉

Marco, turismo gera emprego, que diminui violência, que ajuda na preservação (qdo sustentável) etc..etc..etc…
Estamos falando de uma “cadeia produtiva”. SIM !!! muitas pessoas vivem disso !
Então quando você escolhe um “destino turístico”, vc interfere na cadeia produtiva, sendo assim quando escolhemos o Brasil, estamos valorizando sim o país, tanto quanto móveis com certificação ambiental…
Na minha opinião ambos estão valorizando o país, aquele que viaja até a Amazônia, aposta no destino, leva renda para a população local e aquele que prefere viajar pra fora mais esta atento em comprar móveis com certificação.

Acho que não devemos usar casos específicos para criar a regra. Não ser assaltado em Porto Alegre não significa que Porto Alegre é segura, e ser assaltado em Paris não significa que Paris é perigosa. Mas, por favor, não podemos negar que o Brasil é infinitamente mais perigoso e violento do que a Europa. Isto é ciência, e não opinião. E outra coisa, valorizar o nosso país é muito mais do que decidir um destino nas férias. Alguém aqui tem o hábito de exigir certificação nos móveis de madeira que compramos? Visitar a Amazônia é uma coisa, tentar preservá-la é outra. Então a pergunta que não quer calar: quem valoriza mais o nosso país, aquele que vai para Paris e compra móveis com certificação ambiental ou quem vai para a Amazônia por achar que assim valoriza o país, mas não se importa em silenciar diante de sua destruição?

    Bom, eu já visitei a Amazônia, tenho vários amigos que moram lá, e posso dizer que o eco-xiismo pseudo-engajado é um dos maiores entraves à melhoria das condições de vida da população. E não só na Amazônia: dependência excessiva do turismo, dependendo do tipo de turismo, aumenta a pobreza do lugar. Explico.

    Dependendo de como o desenvolvimento turístico acontece, ele dá origem a organizações (públicas, mistas, privadas) que acabam orientando todo o lugar para receber os visitantes, às custas de salários baixos e reduzidas oportunidades de industrialização e modernização. O melhor exemplo disso é a Praia do Forte: o IBAMA e o resortão lá instalado exercem uma “ditabranda” sobre a prefeitura local. A Praia do Forte é linda, maravilhosa, mas os salários recebidos na região são baixíssimos e como o lugar se orgulha de manter uma atmosfera voltada para um turismo não massificado, limita as possibilidades de que surja um número maior de hotéis, pousadas, parques aquáticos/temáticos etc.

    Para nós que visitamos o lugar, é ótimo. O resultado em termos de experiência de viagem é perfeito. No entanto, o resultado para a população local no seu conjunto é nefasto. Nada contra o fenômeno, só não achemos que estamos colaborando e sendo conscientes e sustentáveis viajando a esses lugares enquanto detratamos quem pega uma excursão para Orlando está sendo culturalmente insensível e tal.

    Alguns hotéis de selva na Amazônia fazem igual ou pior: fazem lobby contra qualquer melhoria significativa nas cidades e vilas próximas às quais estão instalados, seja a abertura de uma rodovia, ou a construção de casas de alvenaria em substituição a palafitas. Essa prática de forças pessoas a manterem contra sua vontade um estilo de vida original, “autêntico”, do tipo que os visitantes esperam é extremamente danosa no meu ponto de vista, pior do que qualquer aterramento de mangue que um resort decida fazer em uma capital do nordeste qualquer.

Atenção: Os comentários são moderados. Relatos e opiniões serão publicados se aprovados. Perguntas serão selecionadas para publicação e resposta. Entenda os critérios clicando aqui.

Assine a newsletter
e imprima o conteúdo

Serviço gratuito