Novas regras de bagagem da Anac

Cobrança por bagagem: afinal, o preço das passagens aéreas vai ou não vai baixar?

Cobrança por bagagem

A notícia só não repercutiu mais porque saiu no meio do carnaval: a repórter Luciana Dyniewicz, do Estadão, arrancou do presidente da Gol, Paulo Kakinoff, a declaração de que ‘o início da cobrança por bagagem não garantirá passagens mais baratas do que as atuais’. A única coisa certa é que ‘quem viaja sem bagagem vai pagar menos do que quem viaja com bagagem’.

O acesso sincericida do presidente da Gol contradiz todo o script de divulgação das novas medidas, adotado tanto pela Anac (agência reguladora do governo) quanto pela Abear (associação das cias. aéreas). E pode pôr em risco a própria implantação da regra, já que existe um decreto legislativo, já aprovado no Senado e aguardando votação na Câmara dos Deputados, que barra a cobrança de bagagem. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tinha ‘sinalizado’ (é este o verbo que a maioria dos jornais usou) que deixaria para pôr o decreto em votação depois da cobrança de bagagem entrar em vigor, dia 14 de março, para que fosse possível avaliar se a regra realmente baixaria a tarifa média. Resta saber se a declaração do presidente da Gol não vai mexer nesse cronograma.

Afinal, a cobrança por bagagem vai ou não vai baixar o preço das passagens aéreas? Meus dois centavos de pitaco:


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As aéreas não precisam de lei para aumentar preços

Desde 2001 as tarifas aéreas no Brasil estão liberadas. Na prática, as cias. aéreas podem cobrar o que quiserem — perdão: o que o consumidor topar pagar. Seguindo um sistema inventado pelos americanos na década de 80, o preço das passagens é dinâmico, e passageiros num mesmo vôo podem ter comprado seus bilhetes a preços radicalmente diferentes — alguém que comprou uma passagem superpromocional pode ser vizinho de assento de alguém que pagou tarifa cheia. Grosso modo (e põe grosso modo nisso), funciona assim: computadores calculam quantos assentos terão comprador a preço cheio em cada vôo, e liquidam com antecedência os assentos que ficariam vazios.

Exemplo prático. Na antevéspera de carnaval, quinta-feira dia 23 de fevereiro, eu tinha uma ponte aérea Rio-São Paulo (ou seja, no contrafluxo do carnaval) marcada para as 17h. Paguei R$ 133 por essa passagem, já com taxas. Mas como na quarta-feira tinha caído um temporal no fim da tarde em São Paulo que fechou o aeroporto de Congonhas, achei que seria arriscado viajar às 17h, e resolvi antecipar o meu vôo. Fui conferir a disponibilidade de assentos no app da Gol. Para sair às 13h40 (um vôo que, na época da minha pesquisa, oferecia a mesma tarifa que eu paguei) a tarifa mais barata era de R$ 1.100, com taxas. Consegui embarcar sem pagar diferença tarifária (era interesse da cia. tentar vender o meu assento no vôo mais tarde). Ou seja: posso ter voado na companhia de algum passageiro que pagou 9 vezes mais do que eu.

A ponte aérea de R$ 133 (com taxas) só existe porque houve a liberação de tarifas lá em 2001. Se não fosse pela liberação, é possível que todos os assentos estivessem tabelados em, sei lá, R$ 400 (que deve ser o preço médio de uma ponte aérea, hoje). Mas a tarifa de R$ 133 só existe também porque a liberação permitiu que existam tarifas de R$ 1.100 (ou mais) para o mesmo trecho. Entra tudo na mesma conta. Se proibissem as cias. aéreas de cobrar R$ 1.100, é provável que a tarifa de R$ 133 desaparecesse também. Se proibissem as cias. aéreas de vender passagens não-reembolsáveis, a tarifa de R$ 133 para compras antecipadas desapareceria (mas a de R$ 1.100 continuaria aparecendo na última hora).

Tirar um componente do preço é marketing consagrado

A estratégia de cobrança por bagagem não é, portanto, um subterfúgio para subir o preço das passagens sob as barbas do governo. É um subterfúgio para tornar os preços mais enxutos e, por isso, mais atraentes para o consumidor — mesmo que ele acabe (ocasionalmente? muitas vezes? sempre?) pagando mais.

Funciona no varejo: as lojas anunciam o valor da prestação, não o valor total da geladeira. Funciona nas promoções de passagens internacionais: mesmo que as taxas dupliquem o valor da passagem, todo mundo fica feliz com a oferta. Funciona na muamba: nenhum preço nos Estados Unidos contém o valor dos impostos, mas no outlet (ou no Olive Garden) pouca gente leva o imposto em consideração.

Para quem aproveita as passagens superpromocionais (tipo essa minha ponte aérea de R$ 133) e viaja com bagagem, a passagem vai ficar mais cara, pois será preciso pagar a bagagem à parte. Já quem paga tarifa cheia (tipo aquela ponte aérea de R$ 1.100 de última hora) provavelmente terá o despacho de bagagem incluído na tarifa e não vai pagar nada a mais. A diferença de preço deve ser percebida por quem aproveita tarifas intermediárias, que devem sim ficar mais enxutas (mas a economia só será aproveitada por quem conseguir viajar sem bagagem).

Afinal, quanto vai custar a mala despachada?

Faltam menos de duas semanas para a entrada em vigor da cobrança por bagagem (que vale para passagens vendidas a partir de 14 de março; passagens compradas até 13 de março têm direito à franquia normal de bagagem grátis). Mas ainda não apareceu nenhuma cia. que diga quanto vai cobrar pelas malas despachadas. De maneira geral, a falta de detalhes sobre como funcionará o esquema de cada cia. só alimenta especulações.

Nos Estados Unidos as aéreas (com exceção da Southwest, que não cobra por mala) cobram US$ 25 pela primeira bagagem despachada. Não acredito que as cias. brasileiras cobrem R$ 75 por mala em vôo doméstico (em vôo internacional, acho que rola).

A Gol anunciou que clientes ‘premium’ e passageiros pagando tarifas mais caras terão direito a bagagem grátis. A Latam informou, ano passado, que em algum momento de 2017 implementaria um novo sistema de vendas, em que tudo seria cobrado à parte (até mesmo marcação de assentos e acúmulo de pontos). Mas tudo indica que só saberemos dos novos esquemas no dia 14 de março, quando abrirmos os sites das cias.

Cobrança por bagagem: afinal, o preço das passagens aéreas vai ou não vai baixar? 1

O melhor da regra: preparar terreno para as low-costs

Eu sou do tempo em que era possível dar no-show (não aparecer num vôo reservado) e viajar com a mesma passagem em qualquer outro vôo, sem nem pagar multa. Sou do tempo em que tinha comida quente e vinho em todos os vôos. Sou do tempo em que 12.500 milhas davam upgrade para executiva em qualquer vôo internacional. (Sou do tempo em que vôo tinha acento, também.)

Por isso, acho a cobrança por bagagem só mais uma ‘inovação’ que mais cedo ou mais tarde vamos ter que engolir.

O lado bom da cobrança por bagagem é que — caso não seja sustada pela Câmara — prepara terreno para a possível chegada de alguma cia. low-cost de verdade ao Brasil. México, Colômbia, Peru e Chile já têm. A Argentina deve ganhar a sua este ano.

Será preciso também mexer na legislação sobre porcentagem de capital estrangeiro em cias. aéreas, permitindo que grupos estrangeiros atuem no nosso mercado.

Caso a cobrança por bagagem não baixe o preço da passagem das cias. aéreas que temos, pode baixar o preço da passagem com cias. aéreas que ainda não temos.

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Novos procedimentos de entrada na Europa

53 comentários

“O lado bom da cobrança por bagagem é que — caso não seja sustada pela Câmara — prepara terreno para a possível chegada de alguma cia. low-cost de verdade ao Brasil. México, Colômbia, Peru e Chile já têm. A Argentina deve ganhar a sua este ano.”

Pra mim este é o ponto. O que baixa tarifa é competição. É concorrência. Cansei de voar em Ryan Air e outras low costs europeias e americanas e nunca me importei em pagar separado cada item (mala, reserva de assento, comida, etc etc). Mas a contrapartida é que cheguei a pagar passagem por EUR 10,00.

Se no fim das contas pagamos o mesmo valor, não sei, mas creio quem viaja “leve” não paga a conta de quem carrega a casa.

O problema é que, na minha opinião, o lobby é grande demais para aumentar o percentual de capital estrangeiro nas aéreas brasileiras. Isso eu acho que não vamos ver.

Qual a opinião do VnV?

Ainda tem o problema do monte de coisa que vc não pode levar na bagagem de mão: um alicate de unha, uma tesourinha, líquidos com mais de 30 ml…

Vou jogar lenha na fogueira 🙈🙈. Por questões éticas isso jamais acontecerá, porém certo mesmo é a conta incluir o peso do passageiro. É justo um passageiro de 120kg sem bagagem pagar menos do que um que pese 50kg com uma bagagem de 32kg? O assunto é complexo mas é de se pensar…

    Oi, Renata
    Na verdade, é justo sim, porque ambos ocupam o mesmo espaço, que é a poltrona-padrão . Que, diga-se de passagem, deve ter sido dimensionada para passageiros com menos de 50kgs … 😉

    Concordo com vc!! Desculpem mas um de 120 e um de 50 kg não ocupam o mesmo espaço. Uma vez viajei SP-Miami ao lado de um obeso e so consegui me ajeitar em metade do meu assento. A pior viagem da minha vida.

Concordo totalmente! É irritante essas pessoas com mala de bordo pegando coisas na “sua cabeça” durante o vôo. Sempre viajo com uma média despachada e só entro no avião com uma mochila que vai embaixo do assento à frente. Acho que a bagagem de mão tem que ser cobrada e caro para desencorajar.

Lu, eu só não despacho a micro mala de segurança em viagens internacionais, aquela que levamos com uma muda de roupa, câmera fotográfica, Tablet e livro. Nas nacionais com até 2h, não é necessário então enfio Tablet e câmera na bolsa.
Tenho horror de subir com mala de mão no avião porque nunca sobra espaço. Despacho sempre também.

Boa tarde Ricardo,
Concordo com suas opiniões. Acho apenas que quem viabiliza do ponto de vista econômico a decolagem de um avião para o exterior, é o pessoal (eu) da “couch” e são estes que pagarão pelas bagagens a serem despachadas.

O q vai acontecer:
1. Mais de 10 kg – vc vai pagar mais do q paga hj.
2. Até 10 kg – provavelmente, vc não vai conseguir levar a bagagem no avião, porque as dimensões da bagagem de mão permanecem… e os gabaritos laranja da Gol vão ser usados como nunca…. e vc vai dançar no dim-dim.
3..Vc vai perder os direitos de franquia de bagagem nos vôos internacionais complemtares ao seu bilhete de passagem (em especial, nos voos domésticos em outros paises).
4. Espere a surpresinha em dólares para pagar a bagagem, quando vc embarcar em Miami, New York, Buenos Aires e Santiago… porque, de lá, elas vão cobrar sem dó, nem piedade…. e suas compras podem ficar desinteressantes.
5. E as compras no Duty Free entram na franquia de 10kg ou não?
Ricardo, como formador de opinião, vc precisa ajudar para q essa liberação deixe de existir.
Abs.

    Alvaro, conte comigo para liderar uma campanha pelo fim do 6,38% de IOF nos cartões, que é uma medida de república das bananas que leva o brasileiro a tomar decisões erradas de câmbio.

    Agora: protestar contra o fim da mamata de 2 malas de 32 kg em todas as viagens internacionais originadas no Brasil… desculpe: aí tenho que concordar 120% com as aéreas. Quem faz viagem de turismo não tem que pagar a conta de quem faz viagem de compras.

    Quanto à cubagem da mala de mão: hoje existem malinhas de 4 rodinhas feitas para caber no compartimento de qualquer avião a jato. Cabem 3 por compartimento, uma para cada passageiro da fileira.

    Ricardo, realmente 2 malas de 32 kg é um tremendo absurdo. Mas 1 mala de 23 kg para uma viagem de 20 dias pela Europa é algo aceitável, no meu ponto de vista, principalmente no inverno europeu. Acho muito chato ter que ficar procurando lavanderia fora de casa ou gastando dinheiro desnecessário com lavagem de roupa em hotel.

    Ricardo, quando começaremos com essa campanha? Essa distorção é absurda!

As passagens para a Europa deram um salto enorme de fevereiro para março. Isso pode ter relação com as novas regras sobre a bagagem?

    Olá, Leila! Você deve ter pesquisado numa época de promoção, e a promoção deve ter passado. Espere pela próxima.

    Também reparei isso, Leila. Inclusive, durante o ano de 2016 comprei em 3 ocasiões diferentes passagens do Rio para a Europa na faixa de 560, 580 Dólares e agora não estou achando por menos de 800 Dólares. Já pesquisei para todos os meses de 2017 e nada. Coisa boa não vem , pode ter certeza !

    Pois é, Márcia…
    Em fevereiro deixei de comprar por um preço ótimo. Agora, olho todo dia e só aumenta.

O maior problema (Além do preço, claro), é como ficará “os compartimentos acima do seu assento”!

Um voo de VCP para CWB vai parecer volta de Orlando no final de Julho. Ou a pipoca no Carnaval de Salvador, 25 em SP e assim por diante!

Os premium vão chegar e colocar suas malas, já os outros deverão ficar com elas guardadas “embaixo do assento a sua frente”!

Que comece os jogos de encaixa aqui, encaixa la!

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