Copa 2014: as cidades-sede e o turismo

Natal, vista de Genipabu
Natal, vista de Genipabu

Você já ouviu falar de Polokwane? E de Nelspruit? De Rustenburg, talvez? Mas pelo menos de Bloemfontein já. Não?

Pois todas essas cidades estão entre as nove sedes da Copa de 2010 na África do Sul. Foram anunciadas há exatos quatro anos, numa cerimônia parecida com essa de domingo que definiu as 12 sedes da Copa de 2014 no Brasil.

É normal. Fora do país da Copa, ninguém se liga nas sedes com antecedência.

Apenas no decorrer deste mês de junho, durante a Copa das Confederações, é que brasileiros, espanhóis, italianos (por conta da participação de suas seleções) e o público mais fissurado em futebol saberão que Rustenburg fica nas redondezas da famosa Sun City (a Las Vegas africana), descobrirão que Bloemfontein é porta de entrada para o parque nacional Golden Gate e conhecerão em detalhes os encantos de Pretória, a capital administrativa do país.

Nos meses que antecederem a Copa, porém, é provável que todas as cidades-sede entrem na pauta de jornais, TVs e revistas do mundo inteiro. Seus nomes serão bem menos obscuros depois do torneio, e algumas delas entrarão no mapa de futuros viajantes à África do Sul.

Processo semelhante vai acontecer com as doze cidades brasileiras oficialmente anunciadas como sedes da Copa de 2014. Daqui até até o Mundial brazuca, a maioria permanecerá desconhecida de quem nunca se interessou mais a fundo pelo Brasil. É possível que a primeira reação de um estrangeiro, ao tomar conhecimento da lista das sedes do Brasil, seja um “Como assim? Não vai ter jogo em Iguassu Falls?”.

Nem todas as cidades, evidentemente, vão se estabelecer como destinos turísticos internacionais depois da Copa. Nenhum brasileiro sonha em ir a Dortmund, mesmo depois da Seleção ter jogado duas vezes por lá. Leipzig e Kaiserslautern são outras duas sedes da Copa da Alemanha que permanecem fora dos roteiros do turista convencional. Entre as sedes brasileiras, Porto Alegre e Curitiba devem seguir pelo mesmo caminho.

Confesso que tenho muita dificuldade de imaginar a logística desta Copa no Brasil. E intuo que as autoridades também não tenham uma idéia muito clara de como organizar a coisa. Isso ainda não é grave. Até porque tenho a impessão de que todos — a Fifa incluída — vamos aprender com o desenrolar da Copa da África do Sul.

A Copa da Alemanha França foi a primeira a introduzir o sistema de uma cidade diferente a cada jogo. Até então, as chaves tinham seus jogos divididos entre duas cidades; cada time (e cada torcida) sabia claramente qual seria a sua base. A partir da Alemanha  França, toda seleção passou a jogar em três cidades diferentes na primeira fase. Apertem os cintos, a base sumiu. Inaugurou-se a Copa da itinerância.

Na Copa mais recente, a da Alemanha, isso deu megacerto, por vários motivos.

O primeiro deles é que a Copa se tornou um evento importante também fora dos estádios: mesmo sem ingresso, você podia assistir aos jogos em telões e participar da Fan Fest. O segundo: o país não é exageradamente grante, e dava para chegar de trem no mesmo dia em qualquer ponto. E para que isso fosse ainda mais possível, lançaram um passe ferroviário válido por toda a duração da Copa: de posse dele, você podia embarcar em qualquer trem, sem necessidade de fazer reserva de assento. Perfeito.

A Copa da África do Sul vai manter o mesmo esquema de itinerância — mas num país bem maior, e sem nem sombra da facilidade logística.

Os pacotes que as operadoras brasileiras autorizadas estão vendendo, com garantia de ingressos para os jogos do Brasil, são turisticamente pobres: a hospedagem é dividida meio a meio entre a Cidade do Cabo e Durban. O traslado às cidades dos jogos seria feito sempre no dia, de ônibus ou avião.

(Acredito que seja possível incrementar o basicão com incursões a outros lugares do país entre um jogo e outro. Mas antes de os grupos serem definidos é meio cedo para especular as melhores brechas e as esticadas mais viáveis.)

Na Alemanha já tinha sido assim: os brasileiros dos pacotes oficiais ficaram em Colônia (onde o Brasil não jogou nenhuma vez), se deslocando aos lugares dos jogos no dia.

Não sei se essa estratégia é comum às grandes operadoras de outros países, ou se é só uma simplificação dos operadores brazucas.

Só sei que o Brasil deveria ter uma estratégia para evitar que isso (um monte de alemão baseado em São Paulo e fazendo bate-volta a Salvador e Cuiabá só para ver um joguinho e retornar) acontecesse por aqui. Temos aí uns dois anos para conceber e azeitar um plano logístico que possa levar o visitante a ver e experimentar o máximo do Brasil durante a sua estada. Tipo: ter pacotinhos prontos e adequados a cada seqüência de jogos, facilmente disponíveis a quem comprar os ingressos de cada fase.

Sobre as sedes escolhidas: acho que é uma boa seleção, que contempla cidades com potencial turístico e outras com tradição futebolística. Das nove cidades, só três ficarão com estádios inúteis depois da Copa: Manaus, Cuiabá e Brasília. E todas têm condições de fazer belíssimas festas durante o torneio. (E a festa, para mim, vai ser o ponto alto da nossa Copa, num patamar superior ao da Alemanha.)

Achei a inclusão de Natal justíssima. É a cidade que tem a maior/melhor rede hoteleira na zona urbana em todo o Nordeste (Fortaleza é a segunda; Recife e Salvador têm seus pólos hoteleiros fora da cidade, em Porto de Galinhas e no Litoral Norte).

Fiquei triste com o fato de terem deixado Belém de fora. Perdemos a chance de consagrar uma segunda porta de entrada à Amazônia — e de botar Belém no mapa do turista brasileiro, que no geral ainda não pensa em viajar para lá. Sem falar que o estádio novo seria útil para a população, que é fanática por futebol.

Cuiabá foi realmente a surpresa. Em princípio achei a escolha esquisita. No front turístico, porém, vai criar o Pantanal Norte como destino, pelo menos para os brasileiros. Falo disso no próximo post.

31 comentários

Enquanto eu estava em Natal no último final de semana ouvia o povo potiguar declarar grande alegria por ter a cidade como sede de jogos. _Vários investimentos. Muito bom para o turismo, diziam eles!

Legal, né?

Marcelo Galvão, além de tudo que foi citado por você, Belém tem paixão por futebol e enche o estádio em todos os jogos. Eu adorei conhecer a cidade, a riqueza da culinária, merecia mais que Manaus, com certeza.

Riq. Sabe qual foi a cidade do Nordeste que não se apresentou candidata mas que poderá colher frutos a partir de uma estratégia? Aracaju. Pensamos o seguinte, para sediar dois jogos uma cidade vai investir X milhões em estádios e infraestruturas, com 15% deste valor podemos lutar para sediar uma seleção que tenha jogos em Recife e Salvador e melhor ainda conseguir que esta seleção faça em AJU a sua pré-temporada,conseguiremos mais de 30 dias de mídia, e um fluxo de turistas maior que excursionistas em dias de jogos. A nossa estratégia se consolidou o ano passado quando durante o Fórum Legislativo para o Desenvolvimento Sustentável do Turismo Brasileiro promovido pela Comissão de Turismo e Desportos da Câmara dos Deputados foi anunciado por Ricardo Teixeira que Aracaju está plenamente qualificada para receber uma das seleção.
Este pode ser um caminho par cidades como Floripa.

    Carlos, está foi a mesma estratégia do ES, ao lado de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e também de São Paulo, o ex-patinho feio do sudeste não teria chance nenhuma. Assim o governador Paulo Hartung já foi logo descartando a candidatura do ES e pleiteando a CBF a ajuda para trazer uma seleção. Já cogitaram algumas como a Itália, devida a enorme população italiana, em algumas regiões chega a 80%. Mas agora a mais cotada é a própria seleção brasileira, como foi noticiado semana passada na Folha de São Paulo. É nois dando uma de mineiro e comendo pela beiradas.

    Hugo, tão patinho feio que até eu esqueci de colocar o ES entre os esquecidos. Tô corrigindo lá.

    Carlos,

    Sei não. Há cerca de um mês meu pai, que queria visitar Aracaju, terminou indo para Santiago, no Chile, porque o preço da passagem aérea REC-AJU era o mesmo que Recife-Santiago.

    Fora que, pelo menos para Recife, a oferta de vôos entre essas duas cidades é muito precária. E de ônibus ou carro, só para quem tem um super espírito aventureiro.

    Márcio, também há pouco mais de um mês Governadores do Nordeste se reuniram com o Ministro Nelson Jobim e o Ministro do Turismo para tratar da questão malha aérea entre as capitais nordestinas, como resultado da reunião o Governo Federal através do BNDES vai liberar uma grana para a Azul comprar mais aeronaves para atender prioritariamente o Nordeste e as ligações entre as capitais nordestinas, apesar do espírito da azul ser voos diretos.
    Mas este problema não vai afetar as seleções (hoje já houve um anúncio que poderemos hospedar duas seleções)pois é claro que ela não vão depender das rotas comerciais. Mesmo se quiserem ir por via terrestre a Salvador ficará a pouco mais de 2h30min de AJU, e mesmo para Recife deverá diminuir muito o tempo de estrada se conseguirmos concluir até lá a nova ponte sobre o São Francisco que reduzirá a distancia AJU-Maceió a escassos 165km (caso a ponte seja em Brejo Grande, mais próximo à foz), mais 202km de Maceió a REC pela litorânea.

    Carlos,

    202 km é a distância em linha reta de Recife a Macéio. Pela estrada, são 255 km (na realidade, 253 ou 256 dependendo de se você for pela litorânea – que não é duplicada, ou pela BR-101, que está sendo duplicada).

    Quanto à notícia da melhoria da malha aérea, é uma grande notícia, mesmo assim acho que Aracaju ainda ficará de fora dos planos dos europeus como opção de estadia. Eu nem digo das seleções, que pode haver acordo para que fiquem aí, mas para os torcedores. Lembre-se que estamos falando de distâncias que para um europeu típico é distância internacional.

Amo Belém…achei uma pena ela ficar de fora.
Como cidade, é muito mais gostosa que Manaus….
Flavia, Coparetas foi demais! rsrsr

Quero saberl o seguinte: quando começam a vender abadás pras Coparetas em Salvador hein: 😆 eu quero, eu quero!!!

Riq, realmente não entendi porque Belém foi excluída. Na verdade, dizem os “especialistas” que pesou favoravelmente a Manaus o vínculo com a floresta amazônica e a zona franca. Cabe então, a meu ver, as seguintes perguntas, em se tratando de futebol: qual a projeção que a cidade de Manaus, com os seus times, tem no cenário futebolístico? Há quanto tempo o principal estádio da cidade (que me foge o nome) não é usado para uma partida de futebol? Ou os jogos serão realizados em plena floresta, tendo como árbitros os empresários da região?
Em termos de turismo, como você bem disse, à medida que a região amazônica já possui uma certa projeção no turismo internacional, perdeu-se a chance de apresentar aos estrangeiros e a muitos nacionais o que o estado do Pará tem: Belém com seus passeios, a ilha de Marajó, Mosqueiro, Salinas, Santarém – a praia Alter do Chão, etc. E a culinária com o pato no tucupi, o açaí, os sorvetes da Cairu, as frutas regionais, etc.
Infelizmente, por diversos motivos, o turismo no nosso país, sobretudo em algumas regiões, é amadorístico. Mas isto é outra história.

Olá, Riq
Parabéns pelo blog, leio quase todos os dias.

O que achaste da exclusão de Floripa? Nós, por aqui, não tínhamos muita esperança mesmo. Afinal seriam três sedes no Sul. Mas acabaram colocando quatro no Nordeste, o que me parece, também, demasiado. Será que somos piores que Natal? Fui ao RN a uns 10 anos e achei a cidade incrivelmente precária. O aeroporto parecia uma rodoviária de interior. Quanto ao interior do estado não dá nem pra comparar. Fui de Natal a Macau e parecia que eu estava assistindo um filme de terror, fiquei simplesmente chocado com a miséria e o total estado de abandono de todas as cidades que vi. Bem, sei que conheces bem Santa Catarina e nesse sentido estamos a anos luz de distância do RN.

Um grande abraço.

    Jader, Santa Catarina seria a melhor opção para apresentar o Sul, esse Brasil pouco brasileiro, ao estrangeiro que vier durante a Copa. Mas com Curitiba e Porto Alegre na Copa, seria redundante.

    Entre Floripa e Natal, desculpe, eu sou Natal. Pela rede hoteleira, pela facilidade de locomoção, pela temperatura em julho.

    Como marqueteiro, eu quero vender o Nordeste como a melhor alternativa para turismo de sol e mar entre julho e novembro, quando há furacões no Caribe e monções no Sudeste Asiático.

    Fora que, estatisticamente, o nordeste teve apenas 44,4% dos estados contemplados, enquanto que o Sul, mesmo com a exclusão de Floripa, foi contemplado com 66,6% de seus estados.

    Por falar nisso, mas sem tem nada a ver :), vocês têm visto a propagando do governo federal para incentivar o turismo? Basicamente só tem cenas no Sul, e a única cidade que aparece de forma indiscutível é Gramado. Achei isso um tanto quanto errado.

Em 98 e 2002 a Copa já foi itinerante, sem sedes fixas para os grupos – em 2002, foram divididos 4 grupos no Japão e 4 na Coreia. O Brasil jogou em Paris, Nantes e Marselha na primeira fase de 98, e em Ulsan, Seogwipo e Suwon em 2002.

    Positivo operante, Paulo. Eu achava, erroneamente, que o Brasil tinha jogado em três cidades diferentes na primeira fase da França por conta do jogo de abertura, mas de fato a Copa já foi itinerante naquele ano. Vou corrigir no texto.

    A do Japão/Coréia eu tinha deixado de fora do raciocínio de propósito, por não ser uma copa turística (Coréia!) e por pelo menos limitado os grupos a apenas um país.

    Riq, a Copa Japão/Coréia foi política (p/ unir os 2 países, primeira na Ásia, etc.), mas Seogwipo, onde o Brasil jogou na primeira fase, é uma cidade bacaninha. Pequena, mas pitoresca.

    A Coréia não é um destino tããão turístico assim, concordo – embora eles estejam melhores preparados pro turista estrangeiro q os Brasil em geral. Entretanto Jeju, onde fica Seogwipo, é uma ilha vulcânica cheia de atrações naturais (lava tubes, crateras com visual do mar, mergulho autônomo, um costão de formação rochosa idêntica ao Giant’s causeway irlandês, etc.) e considerada “o Havaí da Coréia” (é assim que os coreanos chamam), pq o clima é mais quentinho (p/ padrões temperados, claro), e é o principal destino dos casais em lua-de-mel. É bacana de ser visitada, em minha opinião.

Não acredito que Curitiba ficará de fora do roteiro de turistas convencionais. Ela já está na rota do turismo de eventos e cada vez mais atrai a atenção do turista de lazer. Claro que vai depender de toda a estratégia e investimentos realizados, mas além da cidade são várias as opções para os turistas. Além de estar no estado das Iguassu Falls, possui belezas naturais como Vila Velha, o passeio de trem pela Serra do Mar e diversos atrativos no litoral, como as cidades histórias e a Ilha do Mel.

    Gustavo, Curitiba é um destino espetacular para brasileiros, mas deve continuar apenas uma curiosidade no mapa para turistas estrangeiros de fora do Cone Sul. Foz do Iguaçu tem vôos diretos de São Paulo e do Rio… não precisa passar em Curitiba.

Fiquei muito, muito feliz, mas ainda não consigo imaginar a logística nem dentro da cidade, o que dirá entre uma e outra, Riq!

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