Cúmplice

Minha crônica no Guia do Estadão de hoje.

papainoelOutro dia descobri, chocado, que meu sobrinho de sete anos ainda acredita em Papai Noel. Como assim? O guri assiste ao Discovery Kids com áudio original. Entra sozinho naquele Orkut de pingüins para criança. Viu meu iPhone sobre a mesa, pediu emprestado e saiu rodando um videozinho da família comendo pizza. Até que idade uma criaturinha high-tech pode ser mantida nas trevas da carochinha natalina?

Acreditar em Papai Noel depois dos seis me parece tão bocó quando continuar virgem depois dos 18. (Se você pensou em algum outro número para o fim da frase, entenda-se com seus advogados.)

Se eu tivesse filho é bem provável que acabasse mudando de opinião – mas aqui de fora eu não entendo qual seria a utilidade moderna de contar uma mentira que um dia será inevitavelmente descoberta, muitas vezes de forma dolorida.

Que eu saiba, falar de Papai Noel não atende a nenhuma função pedagógica. Não é que nem a Cegonha. A pergunta “De onde vêm os presentes?” não é lá tão difícil assim de responder, mesmo para crianças de menos de dois anos. É simples: papai e mamãe trabalham, ganham dinheiro e vão no shopping. Quem não se comporta não ganha. Pronto. (Já Bicho-Papão e Cuca são incomparavelmente mais úteis. Deles eu não abriria mão, não.)

Mesmo o Coelhinho da Páscoa é mais fácil de aceitar. Os criadores do personagem foram mais inteligentes e fizeram o bichinho passar rápido e sorrateiro pelas casas, sempre no horário em que as crianças trazidas pela Cegonha estão dormindo, aterrorizadas pelo Bicho-Papão e pela Cuca. A história faz algum sentido, entende? Não tem aquela pantomima de ir dar uma volta para ver se encontra Papai Noel na rua e, na volta, descobrir que o velhinho tinha acabado de passar por lá.

Uma vez até dá para engolir,mas – TODOS OS ANOS?

Se bem que… talvez o meu sobrinho já não acredite em Papai Noel. Pode ser que ele apenas esteja naquela fase em que é preciso continuar enganando a irmãzinha mais nova. Eu também passei por isso. É a primeira situação realmente embaraçosa que a vida te impõe. Você acabou de saber que foi feito de trouxa por anos a fio, e agora precisa ser cúmplice dos pais.

O pior é que contar a verdade é ainda mais desagradável. A única maneira digna de descobrir que Papai Noel não existe é sozinho, por intuição e dedução. Ops. Crianças de sete anos que ainda acreditam em Papai Noel não lêem crônicas no final de guias de programação cultural, lêem?

26 comentários

Eu acreditava, até o dia que encontrei o presente dentro do armário. Sem traumas. Deixei que meus filhos acreditassem. Eles ficavam ansiosos aguardando a chegada de Papai Noel. E qual é a mãe que não gosta de ver os filhos felizes? É a magia da infância. Eu gosto.

Han?

Como assim que Papai Noel não existe?

E aquele velhinho que esteve aqui ontem? Tudo bem que o sapato dele era igual ao do meu pai.

Mas esse calçado estava na promoção mesmo, todo mundo tem um igual.

; )

Hô Hô Hô!

😆
😆
Eu sempre ajudei o papai-noel a colocar a roupa ( e a barba).
Depois ele surgia do telhado com um saco vermelho .
Eu adorava isso e sempre fiz o mesmo com as crianças.
É mágico e pé-no-chão ao mesmo tempo.
( e daí fiquei assim essa criatura esquisita, meio aqui, meio lá)

E se, na sua infinita sabedoria, seu sobrinho “decidiu” acreditar em Papai Noel por mais algum tempo? E se, esperto como você diz que ele é, ele percebeu que quanto mais tempo ele conseguir ser criança melhor pra ele?
É uma possibilidade, não? And a real good one, I think! 😉

    Totaly agree, as vezes a criança quer acreditar, quer da ruma esticadinha na infância. Ele só tem 7 anos, por mais high-tech que seja. Se for assim, temos que começar a contar que não existem fadas, princesas,super-heróis, etc…um dia a gente descobre sozinho que não existem e pra falar a verdade não me traumatizei por isso não.

Riq, adorei sua crônica.
O MIguel e eu nunca deixamos nossos filhos acreditarem em Papai Noel. Primeiro que os filhos tem que saber que os presentes são frutos do trabalho dos pais, e depois, para não passarem pelo trauma da descoberta da mentira.
Acho que deu certo.
Beijos.

Se um dia eu vier a ter filhos, eu vou falar a verdade. “Ó, tem uma lenda aí de Papai Noel, quer acreditar, acredita – problema teu”. Ok, com um pouquinho mais de tato. Mas lembro bem de quando as meninas da 2ª série no colégio falaram para nós da 1ª que ele não existia, só pra sacanear. Foi terrível. Quando, num domingo, perguntei para a minha mãe se era isso mesmo, foi um dia muito triste. Depois da confirmação de que era mentira, de fato, eu só consegui balbuciar: “Mas… nem as renas…?” 🙁

Riq, você de certa é um Papai Noel. A gente sonha nas suas viagens TODO O ANO, e tenta realizar algumas. Por falar nisso, tô de saida pra Itacaré, eu minha mulher e filha… de carro… dois mil km… Tem louco pra tudo, né? 🙂

Riq, essa crônica está ótima! Minha mãe mesmo é traumatizada e por isso nunca deixou a gente acreditar em Papai Noel. A Sara ainda acredita… Bjocas e feliz natal!

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