Turismo depois da Olimpíada

Pra tudo não se acabar na segunda-feira

Turismo depois da Olimpíada

Sem ter planejado, fui ontem à festa de encerramento das Olimpíadas do Rio (super super obrigado, Airbnb, pelo convite!). Mesmo achando o show de abertura (que vi pela TV) bastante superior, acabei chorando muito mais ontem. Chorei (de soluçar) no hino tocado com atabaques, chorei nas rendeiras, chorei cantando Asa Branca, chorei na pira sendo apagada pela água da chuva (e Mariene de Castro, que linda!), chorei cantando Cidade Maravilhosa, chorei cantando É hoje, chorei por não estar no lugar dos atletas e poder me misturar ao desfile no final. Que beleza, que orgulho, que alívio. Fazer uma Olimpíada foi o nosso programa espacial. Houston, deu tudo certo.

O protocolo me obriga a abrir imediatamente um parágrafo para dizer o que todo mundo está careca de saber e repetir — ah que os problemas, ah que os custos, ah que as prioridades, ah que os políticos, ah que isso ah que aquilo. Mas não quero competir com a sua timeline do Facebook nessa seara. Concordo com muitas críticas, com outras não, mas isso não vem ao caso nesse espaço. Peço licença para falar de coisas que não ouço sendo faladas por aí.

Agora que (quase) todos concordam que a Olimpíada foi bem-sucedida, vale lembrar que a Copa foi um sucesso também. Isso não ficou evidente porque o 7×1 nos deixou apopléticos no final — e logo em seguida entramos nas eleições mais fratricidas de todos os tempos. Mas fomos anfitriões carismáticos, a aviação funcionou à perfeição, os visitantes se esbaldaram. Eu fui a favor da Copa desde o primeiro momento, por acreditar que seria uma oportunidade única para o turismo estrangeiro no Brasil pegar no tranco. Só que de nada adianta o motor pegar no tranco se não tiver gasolina no tanque. Ao não fazer nenhum follow-up de marketing promocional, o Brasil jogou fora um plano de mídia de R$ 8 bilhões (o custo dos estádios). Ficaram só os elefantes brancos do padrão Fifa de superfaturamento. Fuén.

(Neste momento eu preciso abrir os parênteses de sempre para explicar mais uma vez por que é importante aumentar o turismo estrangeiro no Brasil. Porque este é o maior recurso inexplorado deste país. Porque o turismo é a indústria mais inclusiva e capilar que existe — e a única que ainda não se transferiu para a China. Porque ter déficit gigantesco na conta-turismo — o que gastamos lá fora x o que os de fora gastam aqui –, além de péssimo para a economia, é uma vergonha nacional. Porque o Ministério do Turismo deveria se chamar Ministério da Busca Pelo Superávit da Conta-Turismo. Porque a Embratur deveria se chamar Embrabusca, Empresa Brasileira da Busca Pelo Superávit da Conta-Turismo. Porque a inexistência de turismo estrangeiro no Brasil é ruim também para o turista brasileiro — veja todas as cias. aéreas estrangeiras que extinguiram rotas na crise porque não serviam para o estrangeiro vir ao Brasil, e sim para o brasileiro ir ao exterior; veja a aviação brasileira totalmente focada nas viagens de negócio, pela falta de turistas fora das férias escolares brasileiras.)


Cristo Redentor
Berço esplêndido

Minha esperança: que esse fim de Olimpíada em alto astral contribua para que a gente não repita o mesmo erro do fim da Copa.

Apesar de sido muito mais criticada e minuciosamente escrutinada do que a Copa, a Olimpíada deixa um saldo muito mais positivo e aproveitável, do ponto de vista do marketing promocional. Ao contrário da Copa, quando imperou o padrão Fifa de breguice, a Olimpíada se comunicou de forma talentosa (e brasileira!) o tempo todo. Não falo só da festa deslumbrante de abertura ou da festa emocionante de encerramento. A programação visual foi um arraso e parecia parte da paisagem da cidade (o mestre Milton Glaser, criador da marca I love New York, analisando todas as marcas olímpicas desde 1924 deu nota 8,5 à marca Rio 2016 — ficamos atrás só de Tóquio 64, com 9,2, e Atenas 2004, com nota 9; empatamos com Barcelona 92 e Pequim 2008). Até o mascote se revelou sensacional! (Outro dia ensinei uma turista argentina a ir até a Lagoa pela Vinícius de Moraes, e ela achou engraçado a rua ter o mesmo nome do mascote; contei que o mascote tinha sido batizado com o nome do poeta que escreveu a letra da Garota de Ipanema, e ela achou o máximo.) O website também estava incrível. (E o transporte, inacreditavelmente, funcionou!)

É hora de usar o mesmo pool de talentos usado na Olimpíada para renovar a comunicação do Brasil lá fora. E temos que falar diretamente com o turista — não vamos conseguir implantar o desejo pelo destino Brasil se ficarmos falando só com agentes de viagens em feiras, que é o que fazemos hoje.

A gente é tão ruim de marketing de destino que não aproveitou sequer que a cidade do Rio de Janeiro foi invadida por 400.000 estrangeiros para fazer propaganda de outros destinos brasileiros. Adivinha quem não deixou a oportunidade passar? A Argentina, que dominou o transporte público e luminosos de rua com uma excelente campanha, em que se mostra um país lindo e diverso. Um momento Brasil decime que se siente


Serra da Capivara
Salvem a Serra da Capivara!

Não tenho ilusão de que o número de turistas estrangeiros cresça rapidamente, mesmo com campanha. Enquanto a gente (ou a ciência) não resolver a questão da zika, o turista do Hemisfério Norte vai pensar cinco vezes antes de vir. Ameaça à saúde é um fator que afasta muito mais do que falta de segurança. (Veja o caso do México, que é tido como super inseguro pelos americanos mas que atrai milhões de turistas mesmo assim; Cancún só ficou às moscas quando havia a ameaça da gripe suína.)

Não importa. O tempo até a zika não ser mais ameaça é o tempo de que precisamos para construir uma imagem tão original quanto o show da abertura e tão emocionante quanto o show de encerramento. É também o tempo de fazer uma série de deveres de casa que não dependem do catalisador dos Jogos Olímpicos para serem implementados. Volto ao assunto em breve.

Agora chega de parabéns, e mãos à obra.

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Praia do Riacho

34 comentários

Verdade. Não vimos uma propaganda pelas orlas de Copacabana de turismo brasileiro exceção de Pernambuco que estava com um pequeno estande.
Precisamos remodelar a forma como se vê o turismo no Brasil, e como se atende inclusive o turista nacional.

Concordo com tudo do seu post. Como o Rio e o Brasil com tantos atrativos não recebem mais turistas? Não é somente a propaganda negativa da violência, da sujeira, das doenças como zica, falta profissionalismo nessa área, com pessoal bem treinado falando inglês, sabendo dar informações precisas e divulgando o que tem de melhor! Isso não se resolve com jeitinho, mas com planejamento e gerenciamento. Adorei o Rio na Olimpíada, a energia contagiante dos cariocas e dos voluntários, mas tudo funcionou bem porque teve estudo, plano e execução a contento. Sabemos fazer e precisamos querer ir em frente para crescer a indústria do turismo e melhorar o país com a entrada cada vez maior de turistas e doláres.

Cara !!! Mais uma vez !! Ricardo Freire para Ministro do Turismo !!!
#RicardoFreireMinistroTurismo

Esse cara sabe muito !!

Parabéns mais uma vez !!!

Ricardo, com o governo que atualmente temos, e como os anteriores, só se gente de visão e trabalhadora como você assumisse o Ministério.
Sem isso ficamos na mesma situação dos últimos 500 anos.
Abraços.

Boa reportagem !!
Tenho alguns pontos de vista DIFERENTES.
Os estádios não são elefantes brancos, so alguns, amazônia e campo grande. A fonte nova em salvador está sendo muito bem aproveitada.
Quanto a zica, a própria olimpíadas fez esse “mito” cair por terra, nenhum atleta foi contaminado, claro que é preocupante pra gente, mas como é so um tipo de vírus, não deve demorar a se ciar uma vacina.
O que, no meu ponto de vista, realmente atravanca o turismo estrangeiro no Brasil é: entre as 50 cidade MAIS VIOLENTAS do MUNDO, o Brasil tem 12… os gringos tão acostumados a viajar pra ter paz, sombra e águas fresca… Rsrsr
Também me senti aliviado com o sucesso pro mundo e, principalmente, como brasileiro, ORGULHOSO do que fizemos e como tudo funcionou !!
#SucessoasOlimpíadasRio2016 !!
#SucessoaCopade2014

    Inclua na lista de estádios elefantes-branco o de Natal. E o Mané Garrincha só não virou elefante branco por causa do Flamengo que vive jogando por lá (o que não vai durar muito tempo).

    Segundo essa lista de 2016, o Brasil tem 21 cidades entre as 50 mais violentas:

    https://g1.globo.com/mundo/noticia/2016/01/brasil-tem-21-cidades-em-ranking-das-50-mais-violentas-do-mundo.html

    Repare, contudo, que o Rio de Janeiro não está entre elas, nem SP (mas o Nordeste está quase todo aí). Repare tb que a Cidade do Cabo está no top 10. Ou seja, a questão não é só segurança, mas a sensação de segurança e a propaganda que se faz disso.

    De qualquer forma, o que temos certo é que o Ministério do Turismo faz um trabalho (?) de porco!

    Pois é, o Rio de Janeiro leva a fama, mas é, das cidades grandes brasileiras, uma das mais seguras. Ou menos inseguras…
    Coitado do Michael Phelps, depois da tranquilidade e segurança do Rio, teve que voltar para a sua violentíssima Baltimore.

Demais o teu post Ricardo!! Parabéns!!
Por favor, manda pro Ministério do Turismo!!
Abração!!

Ricardo, como podemos iniciar os contatos para você virar Consultor de Turismo do Governo do Estado de Pernambuco?

A sua análise foi, como sempre, perfeita.

Comparo a nossa falta de visão em relação ao turismo estrangeiro ao desmatamento na Amazônia. Ótimo texto!
Abraço

Como sempre, uma análise muito lúcida! Concordo em gênero, número e grau. Todas as vezes em que me deparo com a propaganda (muito bem pensada) da Argentina espalhada pela cidade penso exatamente em quantas moscas estamos comendo ao longo do tempo… Não acredito que o Brasil – e, especificamente, o Rio – tenha tido, em outro momento, tanta exposição, em tempo e espaço, na mídia mundial. Tomara que não deixemos passar o bonde – perdão, o VLT – e embarquemos, o quanto antes!

Bom dia Riq. Como sempre, excelente texto. Concordo em tudo.Ainda que não esteja escrito (mas tenho certeza que vc pensou), dentre os deveres de casa, está melhorar o ensino de ingles e/ou incentivá-lo, em qualquer nível, qualquer idade, qualquer profissão. Vimos em várias matérias na mídia que uma das grandes questões (e espanto dos turistas gringos) é a dificuldade da língua, como são poucos os brasileiros que falam inglês. É claro que a simpatia e criatividade tupiniquins acabam se virando e estabelecendo uma forma de comunicação, mas isso não é o ideal. E tenho certeza que vc concorda, isso faz toda a diferença! Recebemos uma americana , nós falamos ingles e a troca foi muito bacana. Vamos esperar que dentre essas lições que se deve tirar dessa maravilhosa olimpíada, esteja o estímulo ao ensino do inglês. Acho que essa olimpíada nos deu uma exposição positiva que nunca tivemos, mostramos que, além de gostar de festa, SABEMOS FAZER! Então precisamos aproveitar isso.

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