Caetano Veloso e o abandono do Pelô

Pelô

O assunto não é novo por aqui. Já faz um tempinho que nossos correspondentes soteropolitanos, notadamente a Eunice, apontam para a decadência e a insegurança do Pelourinho, em Salvador. A coisa já vinha acontecendo há algum tempo, mas se acentuou na troca de guarda estadual: quando o PT assumiu o governo, decidiu interromper uma série de programas culturais e turísticos que aconteciam por lá.

Na verdade, o rolo é bem maior do que esse varejinho de projetos. O fato é que os intelectuais ligados ao PT baiano discordam radicalmente do modo como foi feita a restauração e reocupação do Pelourinho pelo todo-poderoso Antônio Carlos Magalhães, falecido em 2007. Acham que a maquiagem da restauração e o uso do bairro para fins prioritariamente turísticos deturpam a natureza do lugar.

Nesses últimos anos, o fluxo de turistas brasileiros diminuiu bastante, e a maioria dos restaurantes e lojas que atendiam a esse público fechou ou se mudou. (O único setor que continuou crescendo foi o de pousadas para gringos — a maioria delas localizada na área do Carmo.) Os turistas que restaram hoje são mais assediados e se sentem mais inseguros.

Resulta que essa não era a impressão apenas dos nossos correspondentes. Em sua estréia como colunista do Segundo Caderno d’O Globo, domingo passado, Caetano Veloso disse mais ou menos as mesmas coisas, num texto articulado e bastante ponderado, sem nenhum ranço antipetista. Até porque Caetano é amigo do secretário estadual da Cultura, de quem diverge especificamente quanto ao assunto Pelô.

Pelô

Vale a pena ler. Caetano começa o passeio em Curitiba, num Lago da Ordem que ele adorou ver restaurado (mas que intelectuais curitibanos como Paulo Leminski achavam artificial) e termina na vitalidade da Lapa carioca, que é o que ele gostaria de ver no Pelô.

Leia:

Política: o Lago da Ordem, por Caetano Veloso, n’O Globo

146 comentários

Vou a Salvador no fim de julho, nunca fui ao Pelourinho, pois qdo estive em Salvador estava só de passagem. Dessa vez estava programado ir conhecer o Pelô. E agora? é furada? existe dias mais propícios? ou é melhor deixar pra conhecer em outra oportunidade? Eunice, o que vc acha? leio e anoto tudo que vc escreve aqui sobre a Bahia, vc entende muito da terrinha!

    O melhor dia, disparado, é terça-feira. É quando rola a missa afro (agora na Igreja da Terceira Ordem do Carmo, porque a igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos está em reforma) e o show de Gerônimo na Escadaria do Carmo. Vá à tarde e fique para a noite.

    (Mas siga as recomendações da Eunice, claro.)

    na terça-feira ainda tem o ensaio do Olodum que, apesar de turistão, é sempre divertido.

    O MELHOR DA TERÇA NO PELÔ É O SHOW DE GERÔNIMO, QUE SIMPLESMENTE É O AUTOR DO “HINO” DE SALVADOR: VC TERÁ CONTATO COM A BAHIA PROFUNDA, NOS ASPECTOS GENTE E MÚSICA. E O SHOW É GRATUITO! DAS 19H30 ÀS 22 H. ESQUEÇA OLODUM, É UMA BANDA QUE PAROU NO TEMPO E UM PROGRAMA PARA TURISTÃO DESINFORMADO.
    PARA COMER NO PELÔ: O ÓTIMO ITALIANO LA LUPA (PREÇOS JUSTOS), o MARIA MATA MOURO (COZINHA internacional) E A FEIJOADA DE ALAÍDE (APENAS RAZOÁVEL, MAS NÃO HÁ OUTRA). COMIDA BAIANA, NÃO TEM NENHUM QUE PRESTE!
    À TARDE: EM 10 MINUTOS VC PODE CAMINHAR PELA HISTÓRICA RUA CHILE(EM FRENTE AO ELEVADOR LACERDA) ATÉ A PRAÇA CASTRO ALVES – ONDE SE LOCALIZA O ESPETACULAR CINEMA GLAUBER ROCHA – AGORA COM O ABOMINÁVEL NOME ESPAÇO “UNIBANCO DE CINEMA”, POR CAUSA DO PATROCÍNIO – COM 4 SALAS, CAFÉ, LIVRARIA E TERRAÇO COM VISTA PARA O MAR, E PROGRAMAÇÃO VARIADA DESDE CLÁSSICOS E CINEMA ASIÁTICO, EUROPEU ATÉ ESSES LIXOS DO CINEMA AMERICANO.

Riq

Valeu a divulgação, e baianos e não baianos, valorizem e usem conscientemente seu voto.

Pelo menos a Tintas Coral pintou parte do Pelourinho, projeto Colorindo o Pelô, é o que eles estão mostrando na campanha publicitária que esta passando na TV.

Acho válida estas iniciativas, se o poder público não dá conta que firme parcerias com a iniciativa privada. Mas neste caso, acho que a Coral foi lá e pintou e pronto.

Riq, a próxima cidade a ser “pintada” pela Coral é a sua Porto Alegre.

Aconteceu a mesma coisa com a Praia de Iracema em Fortaleza. No começo dos anos 80 era um local frequentado só por boêmios. Nem calçada havia. Nos anos 90 houve uma transformação tão rápida que acabou tornando a região no ponto de encontro da cidade (com suas qualidades incluindo a reforma de prédios antigos e defeitos como o grande número de bares que saturou a região). Hoje parece que qualquer investimento na área é feito somente na região do Centro Dragão do Mar, ignorando a região do calçadão. Uma pena. A imagem é de abandono e insegurança. Tenho saudades dos fins de tarde no Cais Bar, de frente ao mar, com boa música e pessoas andando no calçadão.

    A adesão (e a continuidade da adesão) da classe média alta do lugar é fundamental para que esses lugares vinguem. Na verdade, hoje todas as experiências do Brasil nesse sentido deram pra trás — Iracema em Fortaleza, Recife Antigo (que perdeu a boemia), Jaraguá em Maceió. O Pelourinho é só o mais grave (e mais burro, porque talvez seja o sítio histórico mais importante do Brasil). O único lugar organicamente vivo e funcional do gênero hoje em dia é a Lapa carioca.

    De minhas andanças aqui na Europa pude perceber que esse tipo de projeto de requalificação urbana funciona exatamente como o Riq falou: quando a população local adere aos mesmos. Não toda a população, mas o suficiente para manter um ciclo absolutamente natural em destinos.

    Há lugares com volume tal de turismo, em todos os meses do ano, que podem até sobreviver sem adesão local, pois visitantes tendem a visitar regiões pré-determinadas e variar menos. Mas isso é luxo para capitais europeias e por aí vai.

    Quanto a população de baixíssima renda, e restauração de locais degradados, são objetivos incompatíveis em qualquer lugar do mundo.

Outra noticia, o grupo que admnistra a Pousada do Carmo ( Pestana ) está reclamando muito, nos jornais, na queda de ocupação da Pousada devido a violência. A diferença da ocupação do Pestana Rio Vermelho com a Pousada do Carmo é imensa. Os turistas não se sentem mais seguros lá. Reclamam que investiram muito, com o compromisso do governo do estado manter a segurança, compromisso que não está sendo cumprido.

Aliás, em relação a Caetano Veloso e Marcio Meirelles, posso contar um episódio que assiti.Há alguns anos eu e meu marido estavamos assistindo a uma peça do Bando do Oludum no Tetaro Vila Velha ( diretor Marcio Meireles ). Caetano chegou, sentou-se na platéia para assitir à peça. Márcio saiu da platéia, subiu à coxia e o próximo quadro do Bando foi escrachando os artistas que roubavam a baianidade para ganhar dinheiro. Eu achei tão, mas tão deselegante. Uma amostra da inveja e mediocridade provinciana.

Riq, o policiamento no Pelô foi reduzido a metade, exatamente 50% do que era no governo anterior. Esses são dados oficiais, da PM-Ba, publicados em jornais locais, na semana passada. O governo atual identifica Pelourinho com ACM (que só posso entender pelo primado da ignorância )que faz com que todo desprezo ao Pelourinho seja pouco. O Pelourinho é atualmente a nossa cracolândia. É um crime de lesa humanidade. O mesmo desprezo dado ao Pelourinho é estendido à Fundação Jorge Amado ( porque era amigo de ACM ), ao Museu Carlos Costa Pinto – a mais bela coleção de jóias crioulas do país – quase fechando e por aí vai. O Balé do TCA foi “exterminado” – arte burguesa…A politica cultural do estado é um desastre completo. Parece que estamos vivendo aqui a Revolção Cultural Maoista, com queima em praça pública dos bens culturais do povo.

    Nossa, Eunice, muito triste isso.

    Bom, a eleição está aí… que os baianos aproveitem a oportunidade para tentar mudar essa situação 😉

Riq, terminamos hoje aqui em BH o II Seminário Internacional sobre Revitalização de Rios. Nesta segunda edição trouxemos a experiência de Lodz, cidade no centro da Polônia; remoção de barragens nos EUA para volta de peixes e ciclo natural; recuperação do Rio Reno, a experiência do rio Cheoggyecheon na Coréia do Sul (a mais audaciosa para mim, pq envolveu remover um minhocão q foi feito tampando o rio e via q cortava Seul), recuperação do Danúbio, além das experiências nacionais da Meta 2010 (rio das Velhas) e Rio São Francisco.
Em todos os casos tratamos tb de requalificação do espaço urbano e o q pude observar é q os projetos desenvolvidos visavam um real sentimento de sustentabilidade, garantindo recuperação ambiental com uso social e uma nova ótica para a utilização econômica.
Projetos pensados para a sociedade e não impostos por uma “inteligentsia” que supõe saber o q é mais correto. Pensando em participação popular será q os moradores e empresários do Pelô gostariam de manter o modelo anterior ou cair neste purismo intelectual? Será q ao menos a inteligentsia promoveu o debate? Ou quem sabe decidiram também q Salvador como um todo não deve ser mais um destino turítico?
Se a cidade é um organismo vivo (como dizem os teóricos) há de se admitir que a mesma cresce… e se modifica…
Abraços

Realmente, é uma pena o estado que se encontra o nosso Pelourinho. Há poucos dias atrás, eu, soteropolitana orgulhosa da minha cidade, desencorajei um grupo de amigos a visitar o local. Tive medo que a má experiência maculasse a boa lembrança que eles possivelmente estariam levando da cidade.

Independentemente de ideologia política, é fato que o principal ponto turístico da cidade está degradado e perigoso. Será que o nosso governo não vê que estamos deixando de gerar emprego e renda? Concordo com André Lot que a cidade perde bastante o seu charme, quando deixa de oferecer o Pelourinho aos seus turistas, embora eu ache que Salvador é apenas uma parte da Bahia, que tem Itacaré, Morro de São Paulo, Boipeba, Trancoso…

Riq, acho que falar de turismo é também trazer questões como essa!

Abraços da correspondente de Salvador

Riq, sou seu fã e gosto tanto dos posts de destinos e acho que você se supera ainda mais quando discute ou comenta assuntos mais “filosóficos” do turismo (sugestão: crie uma tag rs)

Esse tema de requalificação de área (além da restauração de prédios) é sempre polêmico. Eu penso que é impossível querer reproduzir uma atmosfera de 20, 30, 40, quanto mais 100 anos atrás. Prédios, sim, mas as pessoas, a cultura, tudo muda. Se for para ficar representativo, levado ao extremo esse raciocínio indicaria a encenção de castigos corporais e comércio de escravos para dar um caráter “autêntico” ao local.

Já viajei por muitos lugares aí, Brasil e fora. Excetuando parques históricos ao estilo Coliseu, Gettysburg ou museus que encenam a vida antiga como a Tower of London, eu acredito que os lugares em que mais há futuro são aqueles em que existe uma dinâmica acontecendo.

Tentar “fotografar” um lugar como o Pelourinho e congelá-lo no tempo, mesmo que esse tempo seja não o “original”, mas o do auge de uma decadência, é um grande contra senso. Em qualquer cidade europeia que se preze, as regiões mais históricas são justamente as mais concorridas para museus, restaurantes e atividades culturais. Menos de 8% da população de Amsterdam mora no “Canal Belt”, mas é ali naquela área que é pequena em comparação com a cidade que a cidade se faz ao mundo.

Com o Pelourinho, Salvador tem seu maior atrativo para atrair turistas nacionais e internacionais. É um ícone. Sem o Pelourinho, Salvador, com todo o respeito, tem praias que perdem feito para outras capitais do NE e competição acirrada com duplas do tipo Recife-P. Galinhas, Natal-Pipa. É um certo exagero, sim, mas a filosofia que está por trás desse tipo de ação é preocupante.

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