É paranóia minha, ou não existe mais notícia que não contenha a palavra “suposto”? De repente, tudo virou “suposto” – de esquema de corrupção a assassinato seguido de ocultação de cadáver.
Eu sei que dar ao suspeito o benefício da dúvida é o ponto de partida de qualquer processo de justiça. E acho louvável que a imprensa não saia mais condenando todos os suspeitos da primeira página.
O meu problema é com a palavra que escolheram para usar como padrão. “Suposto” é péssimo. Está ali ali com “risco de morte”, “diferentemente” e outras bobagens que os revisores têm imposto ao público.
Atenção, burocratas padronizadores do idioma: muito antes de “suposto” entrar para o jargão do jornalismo, já era usado pelos brasileiros – com um sentido totalmente diferente do que os senhores querem imprimir.
Na vida real, quando falamos de um “suposto” isso ou aquilo, não estamos concedendo o benefício da dúvida; estamos apostando todas as fichas na falsidade da suposição.
“Suposto” já vem tão impregnado de ironia, que é como se fornecesse aspas para o que vem depois. Uma suposta namorada, por exemplo, é um óbvio golpe de marketing: o cara é gay. Se a prefeitura supostamente fiscaliza, é porque duvidamos disso com veemência.
Daí quando a repórter da TV vem falar na “suposta morte” da amante do goleiro, eu tenho vontade de mandar uma suposta bomba ao suposto editor que obrigou a suposta criatura a falar desse jeito.
Sugestão: que tal, enquanto não acharem o corpo da pobrezinha, usar a palavra “desaparecimento”? Pronto. Ninguém se compromete, mas também não zoa com o espectador.
Posso pedir um favor? Da próxima vez que vocês pegarem alguém transportando dinheiro na cueca, pondo dinheiro em meia ou combinando empresas de fachada por telefone, dá para não usar a expressão “suposto esquema de corrupção”? Que tal, no lugar, empregar locuções como “acusado de” ou “suspeito de”? Ou aqueles lindos verbos no condicional, por que não? Fulano “teria” recebido, a quadrilha “agiria” no ministério... O futuro do pretérito vem com o benefício da dúvida do tamanho exato que esse pessoal merece.
Ou, pelo menos, é o que eu suponho.
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