Nesta semana a Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas) lançou a 2ª edição do seu Guia do Passageiro, um excelente tira-dúvidas sobre todas as questões relacionadas ao ato de voar comercialmente no Brasil.
A edição 2016 do Guia do Passageiro foi atualizada com um capítulo completo sobre acessibilidade a passageiros com deficiência -- um quesito em que as cias. aéreas e aeroportos evoluíram bastante nos últimos tempos, e que se tornou ainda mais premente por conta da realização dos Jogos Paralímpicos do Rio.
Para lançar o Guia do Passageiro -- que tem versões em papel e também em PDF (baixe aqui) -- a Abear fez um café da manhã para a comunidade da aviação, animado por palestras curtas de especialistas.
A psicóloga (e ex-comissária) Rosana D'Orio contou como trata pacientes com medo de voar -- e ensinou exercícios espetaculares para domar a ansiedade causada por descargas indesejáveis de adrenalina.
As sócias (e cadeirantes) Paula Ferrari e Selma Rodeguero, que realizam eventos adaptados para pessoas com deficiência, contaram sobre suas (boas e más) experiências em viagens de avião e o que ainda precisa ser feito para aperfeiçoar o atendimento a passageiros com necessidades especiais.
O terceiro palestrante foi este que vos bloga. Acompanhado por minha mala de 4 rodinhas tamanho P, discorri sobre o que mudou na relação entre passageiro, passagem aérea e avião nos últimos 20 anos.
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Minha tese: não foi só o passageiro iniciante, que começou a voar com a recente democratização das viagens aéreas no Brasil, que precisou aprender a voar de avião. Os passageiros experientes, como eu, precisaram reaprender a voar.
Há 20 anos, por exemplo, uma passagem aérea era quase um bem durável. Você comprava a passagem e, se não aparecesse no dia e na hora escritos (à mão) no seu bilhete, era só remarcar para outra data, sem multa nem nada.
(Com tanta gente que não aparecia, as cias. acabavam vendendo muito mais passagens do que assentos, e o overbooking era um risco cotidiano.)
Era possível 'segurar' uma reserva sem comprar a passagem praticamente até a hora do vôo. Os mais ninjas conseguiam ter reservas para vários vôos num dia só, para escolher conforme o horário em que conseguisse sair da reunião.
Não existia internet, mas gente fina não fazia check-in pessoalmente: as maiores agências de viagem tinham despachantes nos aeroportos, que faziam o check-in para seus clientes, muitas vezes sem nem precisar apresentar documentos (afinal, eram conhecidos dos atendentes!).
Por sinal, viajar com passagem de outra pessoa era molezinha -- esse negócio de conferir a identidade do passageiro no portão de embarque só emplacou mesmo, em vôos nacionais, depois do 11 de setembro.
Os mais vintage devem se lembrar do tempo em que as passagens eram tabeladas e custavam a mesma coisa em qualquer dia, horário ou cia. aérea (a exceção eram os 'corujões', vôos com desconto que decolavam depois da meia-noite). Quando saía a notícia de que o governo ia aumentar as passagens, todo mundo corria para emitir trechos de que fosse precisar nos próximos meses. (A combinação de inflação galopante com reajustes salariais mensais fazia com que a prestação fosse ficando mais barata, em termos relativos, ao longo do pagamento do carnê...)
Muitas dessas mordomias eram sensacionais, mas tinham como efeito colateral o encarecimento das passagens para todo mundo. Quem nunca perdia vôo pagava por quem dava no-show. Quem era caxias pagava por quem fazia múltiplas reservas.
Em 2001, com a liberação do preço das passagens, os privilégios embutidos no preço da passagem ou foram extintos ou passaram a ser cobrados. Viajantes como eu tiveram que aprender a respeitar dia e horário do vôo, e a se conformar em voar em aviões mais cheios. Hoje as passagens compradas de última hora estão mais caras do que nunca, mas em compensação existem tarifas promocionais para compra com antecedência que seriam inimagináveis há 15 anos. Para cada ponte aérea de R$ 1.200 (ida!) existe uma de R$ 99 (às vezes no mesmo avião, e pagas por vizinhos de assento). Quem começou a voar depois do boom da aviação aprendeu o mecanismo rapidinho. Quem estava acostumado às passagens tabeladas e remarcáveis infinitamente tem dificuldade de aceitar a nova ordem das coisas.
A Abear tem números que, quando corrigidos pela inflação, revelam que o regime de liberdade tarifária baixou em 50% a tarifa média em vôos domésticos. Não é o que você sente ao pesquisar vôos para Maceió em janeiro ou ao compar uma passagem para um casamento em Vitória no fim de semana que vem -- mas se você usar para as passagens domésticas a mesma estratégia que usa para comprar passagens internacionais (antecedência, fuga de férias/feriados, alerta de promoções) consegue passagens bastante em conta.
Terminei a palestra sugerindo duas regrinhas para as cias. aéreas.
A primeira, já sei, causaria bastante controvérsia. Por mim, todos os vôos até 3 horas seriam não-reclináveis. Se ninguém reclinasse a poltrona, todos teriam mais espaço aéreo durante toda a viagem...
A segunda, se for boa, provavelmente alguém já pensou antes, só não conseguiu implementar. Por que não se tenta um desembarque ordenado, em grupos, como acontece no embarque? Primeiro o comissário autorizaria os passageiros do corredor a se levantar. Depois deles, sairiam os do meio. E por fim, os da janela. Não faz sentido?
E você? Tem alguma regrinha que gostaria de implementar? Conta aí!
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