O escolhido II (minha crônica no Divirta-se do Estadão)

Emoções baratas

Já era hora mesmo de perder a virgindade. Eu já vinha escapando disso há uns vinte e cinco anos, desde o tempo do Ornitorrinco. Não tô legal, sei lá, mil coisas – e lá descia uma atriz para arrastar um gordinho careca tímido para o palco.

Nunca achei graça em cena de platéia. Sempre me punha no lugar do pobre gordinho careca tímido. Sabia que meu dia havia de chegar. Acho que o êxodo do público do teatro se deve aos números de platéia. As vaquinhas também fugiriam do campo se vissem o que acontece no abatedouro.

Domingo passado fui assistir de novo a um dos meus espetáculos favoritos de todos os tempos, Emoções Baratas. Na primeira temporada, há vinte anos, fui bem umas sete vezes. Emoções Baratas é inclassificável – não chega a ser teatro, é mais do que um show de música ou um espetáculo de dança. Não há diálogo nem enredo linear. Mas existem personagens bem definidos, que se constroem dançando. Aos quinze do primeiro tempo você já inventou uma história para cada um deles.

No domingo eu ia me lembrando das cenas à medida que aconteciam. Boa a moça que faz o personagem que era da Selma Egrei, não? Olha só! Esse dançarino na primeira montagem era o Sebastian da C&A. Estava tão absorto, que tinha me esquecido do número de platéia.

A coisa começa inofensiva. Dançarinos e dançarinas tiram espectadores ao acaso para uma rápida dança de salão no palco. Fiquei aliviado quando, da minha mesa, levaram o meu cunhado. Foi quando fui puxado por uma look-alike de Josephine Baker. Tentei resistir o quando pude, mas não foi possível. A mulher era uma força da natureza, e ganharia de mim em qualquer competição, de queda de braço a cuspe a distância.

Pois bem. Enquanto os outros sorteados se divertiam de rosto colado, eu, que não sei dançar nem sozinho, virava um personagem: o gordinho careca tímido promovido a escada da dançarina engraçada. Lá pelas tantas, ela cochichou: “Me segura!”. E quando dei por mim, tinha uma bailarina dependurada pelas pernas na minha cintura. E de lá não saiu: desci as escadas com ela assim. O YouTube não mente.

Não deixe de ver Emoções Baratas. Mas se puder, antes de ir faça regime e deixe crescer cabelos.

23 comentários

hhaha. A chamada no twitter está digna de campanha de marketing. Impossível não clicar. E quero ver no Youtube. Ainda bem que você capitaliza… e ainda escreve uma coluna deliciosa. 🙂

Peruca nele!

Eu costumo ser alvo. De participante do show do Rei Leão a rostinho colado com o Chris Montez, já passei por muito nessa vida. Mas tendo a achar divertido, depois que o constrangimento passa 😀

Meda! O-D-E-I-O esse tipo de exposição, como vc. Talvez por isso que não curta teatro. Fico nervosa só de pensar…pelo menos no cinema ninguém sai da dela pra te puxar!

Haha…ainda bem que fui dançarina. Seguro a onda tranquilamente. Quédizê, exceto pela parte do gordinha…

Ai que medo! Eu também não sei dançar. E acho que não teria forças para carregar uma “força da natureza” na cintura. Vou deixar meu cabelo bater no meio das costas! Será que devo também recomeçar a dieta? 😉

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