O esporte radical do turismo

No Louvre

Desculpe se o título levou você a pensar que eu falaria sobre trekking, rafting, expedições de moto ou viagens em veleiro. Na verdade o assunto é bem mais prosaico: por que costumamos exigir tanto de nós mesmos durante nossas viagens?

Tudo bem que a gente normalmente disponha de menos tempo e de menos dinheiro do que gostaria. Só o que o primeiro luxo a ser cortado de qualquer viagem parece ser dormir. O segundo, descansar.

Daí a transformar qualquer viagenzinha numa maratona é um pulo.

É bom lembrar que toda viagem envolve, por definição, um stress emocional considerável. Chegar numa terra estranha, aprender a se localizar, ativar o alerta anti-encrenca, negociar todos os movimentos com eventuais companheiros de viagem, tudo isso exige bastante da gente. Mas é parte indissociável do desafio – e do prazer – de viajar.

No entanto, junte-se a esse stress emocional um excesso de exigência física, e daí eu acho que a coisa já configura masoquismo.

Veja a diferença. Quando um atleta vai fazer uma maratona, um trekking ou uma travessia a vela, ele passa meses, anos se preparando. Mas quando a gente sai de casa para dormir uma noite sentado num avião e, ao desembarcar, pegar um carro para dirigir 350 quilômetros até o destino final, ninguém acha que é preciso preparo físico especial.

E por aí vamos. Não prevemos alguns dias de adaptação ao novo fuso horário. Atulhamos nosso itinerário de paradas. Inventamos vôos de madrugada. Fazemos bate-voltas de três horas de ida e três de volta, contra a opinião de todos a quem perguntamos. Enfrentamos frio sem estarmos vestidos com as roupas adequadas. Saímos para cumprir nossos roteiros mesmo chovendo canivetes. Deixamos que nos marquem conexões apertadas, que nos fazem viajar com o coração na mão.

Por que isso? Porque viajamos com o espírito dos alpinistas do Everest. Encasquetamos com objetivos que nos impomos e não sossegamos enquanto não fincamos nossas bandeiras em cada um deles.

Nada contra ter objetivos ou enfrentar desafios.

Mas proponho objetivos e desafios de outra natureza.

Que tal nos desafiarmos a viajar da maneira mais prazerosa e confortável, com o tempo e o dinheiro de que dispomos? Exigindo menos do corpo e oferecendo mais recompensa à mente? Praticando, nas férias, aquilo a que nos preparamos durante o resto do ano: curtir bastante?

86 comentários

Ahaha olha, eu vou dizer que sou meio maraturista também. Mas tudo isso também depende do tempo que você dispõe pra uma viagem. E, o mais importante de toda e qualquer viagem (pelo menos pra mim) é o seguinte: faça seu roteiro de acordo com o que VOCÊ quiser ver.

Eu sempre fiz isso nas minhas viagens, e nunca me arrependi. Na minha última viagem, pra Montréal, fiquei 2 semanas por lá. Não conheci o Mont Royal (montanha que deeu nome à cidade), mas passei a manhã inteira no Oratoire Saint-Joseph (que muita gente passa na porta e vai embora) e vi a cidade inteirinha de lá de cima. O caminho Montreal – NYC eu não fiz de avião, mas sim de trem (demorei 11 horas ao invés da 1 hora de avião). Mas chegar no centro de Manhattan, já noite e com tudo iluminado também não teve preço, bem como passar por cada cidadezinha que eu nem imaginava que existia (e outra coisa que também não tem preço: não precisar ficar praticamente pelado pra passar na imigração dos EUA. De trem é tão tranquilo que parece que é uma triagem!!) e que no outono fica um espetáculo só. Já na Big Apple, eu não conheci a Brooklyn Bridge, mas fiquei no Central Park uma manhã inteira vendo as gravações de Gossip Girl, um seriado que amo.

Então mais importante do que o que os livros e as pessoas queiram que você conheça, é melhor você definir o que você quer conhecer. De Paris eu não saio sem conhecer o Garnier (ahaha Fã de Fantasma da Ópera é triste… ahaha)

    Dani, não sei se ainda é assim, mas já voei do Canadá para os EUA e a imigração foi super tranqüila também – fui de Toronto para NYC e a imigração foi feita em Toronto mesmo… Resultado: tenho um carimbo surreal no meu passaporte, que diz que entrei nos EUA por Toronto! 😯

    Isso também acontece em Aruba! Acho que é pra facilitar quem vai fazer conexão — a bagagem pode ser despachada direto para o aeroporto final.

    Em Nassau, Bermuda e em Dublin também funcionam esquemas de US border preclearance. O que ocorre é que as cias. aéreas americanas fizeram um lobby gigantesco para o governo federal americano ampliar o número de aeroportos com alfândega e posto imigratório, para expandirem seus vôos do Caribe e Canadá para os EUA (o caso da Irlanda é uma exceção por outros motivos). Como o número de possíveis origens desses vôos internacionais era muito menor que o número de destinos de/para onde as cias. queriam voar dentro dos EUA, o governo dos EUA fez acordos com governos de vários países para estabelecer postos de inspeção imigratória antes da partida, como forma de facilitar conexões, reduzir a necessidade de controles de imigração em mais aeroportos dentro dos EUA e por aí vai.

    Em tempo: não existe possibilidade de médio prazo de tal sistema ser adotado no Brasil. Ele só é viável onde a taxa de recusas é baixíssima a nula, pois do contrário expõe funcionários americanos à ira e pressão de autoridades locais (imaginem, comparativamente, se a imigração para a Espanha fosse feita em Guarulhos e nao em Bajaras).

Caro Ricardo,
Seus textos são sempre primorosos, dão gosto de ler cada palavra.
Acho que cada pessoa tem seu ritmo, e nem sempre o que é bom pra um é bom pra todos. Eu adoro programação, e quando vou viajar programo tudo com gosto, ocupando uma parte do tempo com os lerês meio obrigatórios de cada lugar, mas sempre deixando tempo para o inesperado. O melhor de cada viagem acontece justo nesse tempo, em situações absolutamente improgramáveis.

Riq, já fui assim. Exatamente tudo isso que você descreveu.

Tem uma frase que eu sempre guardo comigo que é a seguinte: “informação sem utilização não é conhecimento”.
Conhecer 12 países em um viagem, não é conhecer, é no máximo arrumar a desarrumar a mala em 12 países. Ou ainda tomar 6 ou 7 cafés da manhã em países diferentes ( e rápido, porque o ônibus está saindo). Conhecer exige tempo, dedicação. Como tudo na nosso vida. Não se vira um expert em um lugar conhecendo apenas os top 10. É muito mais do que isso. É como uma diferença entre a quantidade de energia elétrica de um relâmpago e um vagalume.

Mais uma vez, seguindo as suas dicas, aluguei um apartamento em Paris. Foi uma espécie de pós-graduação na cidade. Muitas vezes o nosso programa era curtir a “nossa casa” parisiense, como fazemos várias e várias com a nossa casa daqui. Sem obrigações, sem lerês…

Pra mim agora, viajar é muito mais o “cotidiano” do que a “ilustrada”…

Adorei os posts do nunca-chega e esse. Já fiz de tudo…mas hoje me bato para não aceitar maraturismo (recentemente foi difícil mas a viagem acabou nem rolando…). Tô programando uma viagem com minha mãe e tá sendo um ótimo exercício – será minha 4a vez em Paris, onde temos 1 coisa por dia programada, só o básico. Eu tenho certeza que ela vai virar para mim e dizer “ah, vamos andar mais um pouco”, mas poder, se quiser, descansar após o almoço, dormir até um horário que eu não acordaria para trabalhar, não tem preço!!!

Realmente isso é mais comum do que se imagina e não adianta dar conselhos, na verdade eu gosto de fortes emoções e muitas vezes quando solicitada minha opinião eu digo, “Não, essa conexão é humanamente impossível, eu iria, mas não recomendo”. É o mesmo que dizer vá no caso dos homens que sentem-se desafiados. Já as mulheres são mais prudentes. Meus conselhos são sempre de prudência mas a lei do livre comercio me obriga onde cada um vende e compra o que quer não me permite deixar de fechar um negócio mesmo sabendo que o cara ta entrando numa robada.

Tem gente que simplesmente não aceita os conselhos, tipo: Voo simplesmente lotado, consigo uma vaguinha numa preço acima da média, o cara me pergunta “Será que não vai surgir uma promoção” e eu respondo “Não tenho nehuma informação a respeito, meu conselho é de prudência, é melhor adquirir agora porque no geral a tendencia é de aumentar (lei da oferta e da demanda). Na maioria dos casos o cliente fecha negócio, pior é quando ele faz e depois o preço aumenta. Isso acontece muito também com aqueles que adquirem seus bilhetes por conta própria. A verdade é que todo mundo gosta de um pouco de emoção, tem gente que não vive sem.

Meu conselho pra quem é muito estressado e não aceita erros é Slow Travel, um estilo de viajar pouco difundido infelizmente

    O meu maior medo são as tais conexões “interline” que envolvem cias. diferentes. Mesmo sendo o mesmo bilhete, já passei pela situação de uma cia. empurrar a responsabilidade e a conta por um dia extra em Miami para a outra.

Este é um aspecto qe preciso melhorar muito!! Já consigo evitar o tema da outra coluna, o ‘nunca-chega’, sabendo ficar em poucas cidades mesmo em viagem longa, mas dentro de uma cidade ainda sou exagerado.

Tento sair sempre antes das 9:00, e voltar só depois das 20:00, muitas vezes deixando a esposa no hotel para uma ultima caminhada durante o dia. O lado bom é que mesmo comendo bem nestas viagens, volto mais leve para casa – mas ao final do dia (de quase TODOS os dias), estou sempre com os pés doendo de tanto caminhar.

Aí leio uma coluna destas e sei que é assim que preciso fazer, sem loucuras – mas é dificil se conter, viu hehehe

Pelo menos quando o lugar é praia eu já consigo ficar sem problemas em no máximo 2 por dia, com o almoço entre 1 e outra.

Será que nosso rítimo de viagem não depende diretamente da nossa maturidade como viajante? Concordo com a Paula, com o tempo nós aprendemos a viajar melhor, a aproveitar nosso tempo melhor e a nos permetir certas “loucuras” sejam elas almoçar em um restaurante estrelado, passar a tarde toda em um café, visitar um museo lotado ou até mesmo passar 3 horas na fila da Torre Eifel 🙂

Hahahahaha!
Riq amei esse post! Voce sempre se superando em seus textos!!
Tenho que levantar a mao e admitir um mea culpa pois esse post me descreveu inteiramente!
Sou campea de enfrentar voo Ryanair as 6 da manha pra passar 40 horas de passeios intensos em alguma capital Europei, voltando pra casa as 11:30 da noite de Domingo, andando em media 12 horas por dia e comendo sanduiches, chova ou faca sol!
O pobre coitado do meu marido fica acabado e me faz prometer que quando “eu crescer” vou deixar ele ir assar ferias num resort all inclusive onde ele nao tenha que fazer nada a nao ser levar o garfo ou o copo ateh a boca!
hahahahaha
Definitivamente nao sou nada adepta ao slow travel… mas um dia pretendo aderir!
Amei o post!
Abs
Dri Miller

Bem, parabens pelo Andre pelos mandamentos…

Algumas coisas que eu aprendi.Como os voos internacionais estao horriveis, e muitas vezes ha o stress de terminar todo o trabalho antes de viajar, o primeiro dia e para se aclimatar e dormir, num hotel bem gostoso e confortavel… Ja fiz a famosa viagem na Europa, de 5 paises em 20 dias, mas foi ha 20 anos e nao me arrependo nem um pouco… Hoje vou mais devagar, delimito melhor, e por pegar roteiros mais novos e que ninguem conhece, me dou ao luxo de errar, e de fazer coisas novas que podem se revelar fantasticas, como voces leram no Peru, ou uma que foi bem mediocre, como o passeio nas serras de Catamarca, mas que eu quereia conferir (depois eu conto para voces) . Acho que o slow travel e bom, eu particularemnte gosto de viagens de onibus, em paises diferentes, e uma grande oporutnidade de meditar e pensar na vida, desde que nao se passe muito das 4 horas por viagem, quando possivel… Quanto a ficar mum cafe, ou numa praca, sempre achei algo interessante, que capta a essencia da Cidade…E, muitas vezes eu gosto de pegar alguns onibus ao acaso, para ver como e a Cidade de verdade, fora da programacao turisitica… Ja descobri tambem, que pelo menos para minhas necessidades, e considerando’se tambem a questao trabalho, a viagem ideal e entre 12 e 21 dias, fica aquele gosto de quero mais, a vontade de voltar, e nao aquela saudade de casa….

Carla, você está realizando um dos meus sonhos: Mendoza. Sou uma amante dos vinhos e a paisagem local parece fascinante.Depois conta tudo pra nós.

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