Antes de embarcar, eu não imaginava que uma das coisas da selva de que eu mais gostaria seriam... as casinhas.
Acontece que o Solimões, ao contrário do Negro, é consistemente habitado. As casas são espaçadas mas se sucedem de maneira constante ao longo do cruzeiro. A riqueza de nutrientes do Amazonas (em contraste com a acidez do Negro) torna as águas ricas em peixes e as terras ribeirinhas bastante férteis. Nos meses de vazante as terras reaparecem e podem ser brevemente cultivadas -- sempre de forma manual, porque a várzea não suporta o peso de tratores.
Cada casa que você avista funciona como um infográfico sobre a vida sob o ciclo das águas amazônicas. A altura das palafitas indica a expectativa de subida do rio. A marca na madeira mostra até que nível a água efetivamente subiu.
Algumas dessas casas são miseráveis, mas a maioria ostenta sinais exteriores de vida remediada.
Na segunda manhã da viagem, os passageiros do Iberostar Grand Amazon são levados para visitar a casa de uma família cabocla. É um momento muito, muito bacana do cruzeiro.
Quem nos recebe são o seu Álvaro e a dona Léia, que moram numa casa sem reboco, no alto de um barranco. Tudo muito simples, mais impecavelmente limpo e arrumado.
A mesa está posta pro café: podemos provar cupuaçu, torta de banana da terra, ver a farinha grossa que acompanha o peixe e o açaí. Dona Léia guarda as caixas de margarina, que viram seus tupperwares. Dos seis filhos, só três estão na casa: uma das filhas, casada, não mora ali; e os dois filhos adolescentes estão na escola dominical (eles são testemunhas de Jeová).
Damos uma volta pelo quintal. Conhecemos a horta e a casa de farinha -- onde a família produz sua própria farinha de mandioca (e na Amazônia se usa a mandioca-brava, que precisa primeiro ter extraído todo o veneno).
Ainda na cozinha, a capa de um caderno pendurado na parede dizia: "Stylish". Provavelmente eles não sabem o que signifique. Mas é uma boa definição para o que acabamos de ver.
14 comentários