Lares Adventure, dia 2: ruínas pré-incas e uma visita à señora María
No primeiro dia passamos por Pisaq. No terceiro dias chegaríamos a Ollantaytambo. Mas o segundo dia da travessia Lares Adventure não nos levaria a visitar nenhuma figurinha carimbada do Vale Sagrado. O programa do dia era justamente sair do Vale Sagrado, passar pelo Passo de Lares e passar um dia do outro lado das montanhas, no Vale de Lares.
De manhã, o programa seria comum a todos: o sítio pré-inca de Ankasmaka. Depois do almoço, o grupo se dividiria entre os que, durante a palestra da noite anterior, escolheram fazer o passeio cultural, de van (o vilarejo de Choquecancha) e os que optaram pela caminhada de 3 horas (passando por uma laguna andina) até Huacahuasi, onde todos passaríamos a noite.
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Diário de Lares
Dia 2
Depois do café, demos uma voltinha a pé pelo vilarejo de Lamay (altitude: 2.958 m), onde está o lodge da Mountain Lodges of Peru onde tínhamos passado a noite. Visitamos o forno onde o padeiro produz pão para toda a comunidade, e que é emprestado a moradores quando precisam assar leitões ou cuys para comemorações familiares. A van, já com todas a bagagem, nos encontrou na pracinha da igreja, e partimos para o dia.
Ankasmarka (altitude: 4.000 m) se revelaria o mais original dos sítios arqueológicos que visitamos na travessia. A exemplo das outras ruínas, Ankasmarka funcionava como lugar de pouso e entreposto entre Cusco e a selva, desde épocas pré-incaicas.
Os alimentos transportados eram armazenados em silos de bordas arredondadas, que tinham a função aerodinâmica de permitir a livre circulação das correntes de ar frio da montanha, necessárias para conservar os alimentos. De dia os alimentos eram tirados dos silos para secar ao sol (todos tinham cobertura de palha).
O fato da estrada passar rente ao sítio não diminui o lugar — pelo contrário: lembra que os caminhos usados hoje são baseados nas rotas que os nativos traçaram há muitos séculos…
Na saída, demos uma passada na lojinha, que tinha panos lindos, sem cores berrantes, tudo com tingimento natural. Comprei uma estola por 80 soles (R$ 80). Não barganhei (na próxima encarnação eu saberei pechinchar).
Lares
Depois de atravessar o Passo de Lares (altitude: 4.440 m), fizemos uma parada técnica na cidadezinha de Lares (altitude: 3.210 m). O lugar que dá nome ao vale e à expedição não tem maiores atrativos — mas permite uma rápida observação do dia a dia de um vilarejo não-turístico.
(Não há sequer um restaurante com padrão para atender forasteiros; o almoço é um lanchinho que vem empacotado desde Lamay e que comemos na praça.)
Almoçados, nos dividimos entre os intrépidos que vão caminhar até Huacahuasi e os sedentários/curiosos que vão visitar o pueblo de Choquecancha. Adivinha em qual grupo me incluí…
Choquecancha
A 20 minutos de van de Lares, Choquecancha (altitude: 3.050 m) parece muitíssimo mais remoto. Com casas de pedra e caminhos estreitos de chão batido, a vila só não passa por um sítio inca habitado (ok, tô exagerando) por causa dos telhados metálicos das casas, que nos últimos anos substituíram a tradicional cobertura de palha e são horrendos (sem exagero).
Subimos pelas ruelinhas até o ponto mais alto do pueblo, onde uma cruz católica marca a existência de… um santuário andino mais antigo. A vista do vale é um deslumbre (tente abstrair os telhados).
Andrés, o guia especializado em arquitetura e que estuda a cidadezinha há mais de 10 anos, explica que os moradores cultivam batatas num ponto mais alto da montanha, em regime comunitário, e praticam o escambo com outras comunidades para adquirir o que não produzem. Uma pesquisa feita há alguns anos revelou que o morador não gasta mais do que 50 dólares ano; o item que mais pesa no orçamento são pilhas.
O ponto alto da tarde é a visita à casa da señora María. Mesmo sem guias, você acharia a casa: a porta está decorada com flores. Os resquintes de produção, garante o guia Andrés, são coisa dela. Quando estavam organizando o passeio, perguntaram se ela toparia receber em sua casa pequenos grupos de turistas. Ela topou e eles ligaram avisando quando seria a primeira visita. Ao chegar com o primeiro grupo, a casa estava enfeitada daquele jeito — porque assim é o costume em dias de festa.
Ao passar pela porta, a señora María joga pétalas nos cabelos (no meu caso, na cabeça) do visitante. No pátio, outras três señoras nos aguardavam. A produção têxtil do grupo estava pendurada em varais junto à parede.
Um chuvisquinho que começou a cair justamente nesse momento atrapalhou um pouco a visita. Mas tão logo estiou, a señora María retirou o plástico que protegia o seu tear e nos deu uma pequena demonstração de sua arte.
Me encantei com os panos expostos logo à direita de quem entra. Eram da senhorinha mais velha do grupo. Levei uma manta de 150 soles (R$ 150). O povo fez a festa. A señora María não gastou em decoração em vão 🙂
Huacahuasi Lodge
Me lembro do guia dizer que seriam 45 minutos dali de Choquecancha ao lodge, mas apaguei e só acordei quando já estávamos pertinho. Dez minutos depois da nossa chegada, apareceram os bravos rapazes da caminhada.
O Huacahuasi Lodge (altitude: 3.835 m) é o mais bacana dos hotéis de montanha da Mountain Lodges of Peru. Não só pela localização (no alto de um morro, com linda vista para as montanhas, uma delas com o pico nevado) ou pela arquitetura, mas também por ser o primeiro projeto em sociedade com a comunidade. A empresa não é dona da terra, que é invendável; o vilarejo tem 25% de participação nos resultados do lodge.
Fomos recebidos por funcionárias em trajes típicos da região — e de novo, a idéia não foi da MLP, mas das próprias mulheres, que não se sentiam bem usando uniforme 🙂
O detalhe de luxo do Huacahuasi Lodge são as jacuzzis ao ar livre que todos os apartamentos têm na varanda. Infelizmente no dia em que chegamos o sistema de água quente tinha acabado de dar pane e não pudemos aproveitar. (A água voltou de madrugada e, na manhã seguinte, tomei um banho tão demorado que devo ter usado água suficiente para encher a piscinota.)
No jantar, truta salmonada em leito de legumes; de sobremesa, salame de chocolate. Depois, internet e cama — no dia seguinte eu teria que estar em condições para uma travessia de bicicleta.
Ricardo Freire viajou a convite da Mountain Lodges of Peru.
Leia mais:
- Lares Adventure, dia 1: pachamanca e caminhada a Pisaq Alto
- Lares Adventure, dia 3: vida rural e bike pelo Vale Sagrado
- Lares Adventure, dia 4: Ollantaytambo ‘vip’ e luxo no trem
- Lares Adventure, dia 5: Machu Picchu (e um balanço final)
- Cusco: uma voltinha roots pelo Mercado Central de San Pedro
- Dicas de Cusco no Viaje na Viagem
- Dicas de Machu Picchu no Viaje na Viagem
Comentários
Preciso voltar ao Peru, minha ida foi um mochilão de 23 dias por estes lados com 700 doletas, ida e volta por terra.
Já se vão 18 anos, mas as lembranças precisam ser renovadas.
@GusBelli
Há algum problema? Por que não são publicados os meus comentários? Muitas vezes eu quiser participar e não pode ??? 🙁
Olá, Carmen! Os comentários agora são moderados, mas todos os seus têm sido aprovados! O último foi este aqui:
https://www.viajenaviagem.com/2015/03/europa-roteiro-15-dias/comment-page-1/#comment-473447
(Verificamos na caixa de spam e não há nenhum por lá…)
Inveja, inveja, inveja!!! É este o meu sentimento, e nem vou amenizar dizendo que é invejinha do bem, que isso é balela. A cada dia fico mais encantada! Qual é a melhor época do ano para esse roteiro? Existe época ruim?
Tânia, a melhor época para a região é entre maio e setembro/meados de outubro. Janeiro e fevereiro são os meses mais chuvosos (não há Lares Adventure nesse período).
Mto legal!!! Eu, q nunca me encantei por conhecer Machu Pichu, estou tendo uma outra visão, e até comecei a me interessar! Estou louca prá saber da bike!!
Riq, não vejo muito problema em deixar o aprendizado da (heheh) pechincha para depois. Sabe…acredito que a diferença para o turista vale muito menos que para o artesão.
Adorei o fato de ter jacuzzi na varanda de todos os apartamentos. Normalmente só fazem isso nos quartos superiores (mais caros), privando o restante dos hóspedes de uma experiência muito bacana.